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Poeta e apenas poeta

Já me olharam espantados quando digo que sou poeta e só poeta. Que não canto, nem danço, nem atuo, nem pinto, nem bordo, que "só" ...

quinta-feira, 31 de janeiro de 2008

Homo imbobile


Lucas C. Lisboa

O velho inventor fascinou-se com aquele humano que se fazia de estátua, ninguém percebia quando levemente respirava. Um olhar mais atento até veria, de relance, o seu sorrateiro piscar de olhos.


Num estalo lhe viera a inspiração, e meses à fio trabalhou em seu mais novo projeto. Moldando-o à imagem e semelhança do homem. Tinha olhos verdes, uma leve barba por fazer, traços suaves e cabelos cacheados. Sua voz era aveludada como o melhor narrador de histórias infantis. Andava com graça e leveza.


Mas seu verdadeiro propósito era ali ficar como uma estátua, deixando de quando em quando parecer que respirava e piscar os olhos quando ninguém mais estivesse vendo. O velho passava oras à fio admirando o seu próprio homem-estátua.

segunda-feira, 21 de janeiro de 2008

Ecos d'um palhaço trágico

Lucas C. Lisboa

Tudo que se esperava daquele palhaço suicida é que sua última gargalhada, depois do salto, ecoasse cada vez mais distante, até o retumbante soluço final.

sexta-feira, 18 de janeiro de 2008

A quanto tempo nao sentia,

O gosto do meu próprio sangue sangrando
calmamente a dor verdadeira esvaindo
Faz tempo, muito tempo...
Mas hoje preciso senti-lo,

Sentir que ainda estou vivo!
Sentir na pele o que me rasga por dentro.
Hoje é dia de sentir.
Sentir tudo que há de mais terrível.

Para que eu possa me esquecer
esquecer de mim mesmo.
Esquecer que existo.

Pois me venham as laminas, os ácidos,
velas, torturas e loucuras.

Se nada opera efeito,
operar-me-ei cada defeito.

Fatais, fatais vaticinios,
frutos desses meus desatinos,
de meus sonhos irrealizados,
de meus porões mal assombrados.

Cercado, por todos os lados...

Será defeito?
Talvez só tenha me restado
um único jeito...
De tornar-me perfeito.

quinta-feira, 29 de novembro de 2007

Infância

Lucas C. Lisboa

Eu, pequeno garotinho
tão novo dizia poetar:
"cala boca cachorrinho,
deixa luquinhas passar!"

segunda-feira, 12 de novembro de 2007

a barca estígia II

Lucas C. Lisboa

remam remoendo seus erros e dores
desmortos remorrendo seus terrores
rutilam roucos restos desprezados
amargando prantos encarcerados

remam em seu rancor plo rio d'orrores
aprisionados pelas mortas flores
rosas, cravos, outrora derramados
sobr'eterno repouso dos finados

remam mortos, agora penitentes
sofrem por seus viveres indecentes

pois remam por seus crimes cometidos
mesmo quando plos vivos esquecidos

remam sofridos na barca da morte
praguejam por tamanha sua má sorte

quinta-feira, 8 de novembro de 2007

A Barca Estígia

Lucas C. Lisboa

remam remoendo seus erros e dores
desmortos remorrendo seus terrores
rutilam roucos todos desprezados
amargando prantos encarcerados

rancorosos remam plo rio d'orrores
presos por arreios de mortas flores
rosas, cravos, outrora derramados
sobre o eterno repouso dos finados

morreram e agora remam penitentes
sofrem por seus viveres indecentes

pois remam por seus crimes cometidos
mesmo quando pros vivos esquecidos

remam sofridos na barca da morte
praguejam por sua tamanha má sorte

segunda-feira, 29 de outubro de 2007

Marionete de trapos coloridos II

Lucas C. Lisboa

Pois quando noto seu, de fel, sorriso
Eu me deleito nesse doce apreço...
e de tamanho prazer regojizo,
tanto que ao deleite até me esqueço.

Gargalho por ver este olhar nervoso,
aos pesadelos quando eu lhe apareço
a divertir-me no mais puro gozo
Nessas palavras-linhas lhe enlouqueço

Sem mim teus passos são vagos, perdidos.
Sozinha és sem encanto, faz só dormir.
Jogada em qualquer canto o pó cobrindo

Marionete de trapos coloridos,
és assim tão linda que me faz rir!
Pois agora me dance, estou assistindo...

terça-feira, 23 de outubro de 2007

Meu brinquedo II

Lucas C. Lisboa

Seu corpo, aroma e traços bem cuidados,
que nessas mãos se fazem maltratados.
Os seus gemidos tão deliciosos...
que aperto, ouvindo-os ardorosos!

Os seios dela são assim delicados,
que não deixo por menos abusados!
Seus lábios, ao felatio, voluptuosos...
que dou-lhe meus humores mais gostosos!

És minha mais perfeita Bonequinha!
foi feita especialmente para mim:
para meu uso, deleite, abuso e trato.

Oh, mas ela realmente é perfeitinha!
Co'ela em mãos me divirto horas sem fim!
Gozando ambos em cada ato e maltrato...

bem ditos

Lucas C. Lisboa

É lícito ao poeta
se apropriar do que foi dito.
por outro qualquer esteta
que não tem estima disto?

Singularidade

Lucas C. Lisboa

Sou um entre tantos
Entretanto sou mais um
Sou um, entretanto

terça-feira, 16 de outubro de 2007

boas novas num guardanapo

Lucas C. Lisboa

uma verdade selvagem
batendo na minha porta
chegada d'uma viagem
longa, escura, negra e torta

Confeitaria

Lucas C. Lisboa

Poesia formada
numa fornada de versos
mui bem metricada

quinta-feira, 20 de setembro de 2007

Cidade-lua

Lucas C. Lisboa

Menino engenhoso
Vendo pássaros e penas
Fez voar papel

Querendo tão mais:
as núvens todas tocar
era seu intento

De feitura sua
muito bem arrematada
com precisos laços

trabalho ardoroso
feito por noites centenas
colado com mel

Penhasco foi cais
pr'ele para os céus zarpar
ao sabor do vento

Chegou até a lua
Com a sua pipa dourada
maior que seus braços

Malfadado pouso
entre casas tão pequenas
na cidade do céu

Nos tortos beirais
Moradas a se amontoar
sem ordenamento

Caido numa rua
da cidadela aluada
sem de vida rastros

quinta-feira, 6 de setembro de 2007

Ternurinha

Lucas C. Lisboa

"Beijos meu querido?"
Gracias, mas você merece
é um tapa bem doído

quarta-feira, 5 de setembro de 2007

Uma felicidade para sempre

Lucas C. Lisboa

Foi com os primeiros raios d'aurora que Ela acordou, ainda deitada sobre o peito nú de seu amado. Todos os dias era assim, acordava ao seu lado e admirava-o perdidamente. E suspirava, pois finalmente o tinha ali, como um sonho.

Levantou-se sorrindo por saber que os dias tristes agora eram apenas parte do passado. Os obstáculos e inimigos de sua felicidade foram vencidos um a um. Dirigiu-se para a cozinha, como fazia todas as manhãs, e preparou o desejum de ambos com todo cuidado.

Torradas e um chá de ervas para acompanhas mas, açúcar não colocou e sim duas colheres de cianeto. Em uma bandeja, carregou as torradas e as duas xícaras de chá, para o leito que fora desde sempre o ninho dos enlaces.

Ela o despertou com um beijo delicado e sereno. Ele, após retribui-la sorriu complacente para sua amada, ajeitaram-se à cama e começaram o desejum. Provaram das torradas e juntos levaram as xícaras à boca e quase simultaneamente retorceram os rostos pelo amargo sabor e sorriram cúmplices.

Sem pressa. terminaram o café da manhã e se deixaram deitar novamente entre carícias, beijos e afagos até juntos adormecerem.