Publicação em destaque

Poeta e apenas poeta

Já me olharam espantados quando digo que sou poeta e só poeta. Que não canto, nem danço, nem atuo, nem pinto, nem bordo, que "só" ...

terça-feira, 26 de janeiro de 2016

Dos delírios e deleites

Ele todo dia regava
os seios da moça amada
com seu sêmen e saliva
ansioso por sua florada
de lírios e copos de leite

Das coisas

mais fora de hora e de lugar:
-Carne de soja em churrasco
-Retiro espiritual
na sexta de carnaval

Hedonismo

A cama é king
e a preguiça Kong
pra fazer swingue
e fumar um bong

segunda-feira, 25 de janeiro de 2016

Incêndio

Enquanto na floresta se buscava
co'as bocas, bicos, trombas e suas patas
um tanto qualquer d'água para essas matas
que nas chamas do incêndio já queimava

O lobo, sentado, seu vento tragava
usando de suas forças mais inatas
a procurar aquelas almas rotas
que tudo novamente incendiava

As feras atarantadas julgavam:
ele parado, sem nada ajudar!

"Que ser mais egoísta!" - murmuravam
não o viram sorrateiro a circundar...

Pois quando as brasas altas crepitavam
com fome de homens se pôs a caçar.

Quadras calculadas

sílaba poética
é saber que verso
não é aritmética
mas da prosa o perverso
*
prum ouvido certo
versificação
é medida de metro
sem regulação
*
dentro duma métrica
cabe o não pensado
duma frase cética
num texto sagrado
*
o poeta escande
como alguém que canta
e não como quem conta
moedas e as esconde

terça-feira, 12 de janeiro de 2016

à luz da Lamparina

Meu pai criava em sua mente todas as formas, luzes, gestos, olhares e sombras das assombrações que meu avô lhe narrava à luz da lamparina, os filhos da minha geração recebem todos os mínimos detalhes de seus monstros narrados através das telas de seus tablets. Não há mais qualquer espaço para que o espectador do tablet crie em sua mente as feições que recebe das luzes do tablet.  Cada monstro, cada personagem já tem impressa sua cor, forma e tamanho de maneira indissociável, sem qualquer espaço ou possibilidade de liberdade para o espectador.

O narrador da lamparina, o livro de contos e histórias fantásticas, os romances, as epopeias, e as notícias do jornal impresso cada vez mais são substituídas por narrativas apinhadas de sons e imagens que provam e comprovam sua forma como indissolúvel, pronta e acabada. Quadro a quadro em movimento, narrado e articulado sem deixar espaço para que o receptor inclua ali sua perspectiva, sua ótica. Cada mensagem acompanhada de todo um aparato imagético comprova sua veracidade indiscutível, é pois as imagens não mentem.

Num mundo imagético, onde tudo é movimento, fala, som e imagem. Num mundo onde toda informação é dada como pronta, acabada. O ato da Literatura, per si, sem outro suporte que não a escrita é um ato político. A poesia escrita e lida é avisa rara na contemporaneidade. É uma arte incompleta em sua produção pois depende sempre do leitor para ter seu som e imagem concebidos.
No momento em que o leitor  inicia a leitura  é o exato momento que ele se implica no texto pois e forçado a preencher as lacunas do que lê consigo mesmo, com suas experiências, com suas memórias, tendo como argamassa sua imaginação fresca e, pro vezes, nunca antes utilizada. E nesse despertar da imaginação nasce a capacidade de criar novas narrativas para o que já recebe de antemão como dado.
Um livreto de poesia dentro dos vagões do metrô caem, por vezes, no colo desse espectador televisivo, de seu filho empolgado pelo novo jogo em seu tablet. E aquela leitura de poucas páginas, de amor, de piada, de política e até metalinguagem pode despertar o gosto, o desejo por atiçar a parte imaginativa tão esquecida, tão oculta e guardada num quotidiano que não dá mais espaço para seu exercício.
Uma mente capaz de imaginar os olhos, boca e nariz da amada do poeta também é capaz de usar dessa mesma imaginação para descortinar as sombras veladas que os flashes das câmeras não alcançam. Cada dobra de página, cada personagem que é construído gera a dúvida salutar de que se Capitu traiu ou não Bentinho. Se a narrativa do jornal das 10 condiz ou não com a verdade, se a perspectiva é mesmo a única possível, se outras imagens não existem e contradizem aquela posta ao ar em rede nacional. Um poema de amor, num mundo onde a própria imaginação não tem mais vez, é um ato político. Um ato político de despertar pois " a poesia torna possível o que já se tornou impossível na prosa da realidade.

segunda-feira, 11 de janeiro de 2016

Cidade digital

Computador lento
é um engarrafamento
de bits ou de bytes?

domingo, 27 de dezembro de 2015

É como se diz:

Com palmas e bis
doce Beatriz
ficou por um triz
de ser meretriz

quinta-feira, 24 de dezembro de 2015

Tropa Natalina

Começou como tropeiro
pelo sertão derradeiro
das muitas minas gerais,
bem longe das capitais
guiando burros em tropa
e com cavalo que trota!
 
Mula madrinha enfeitada
por muito chão, muita estrada
levava o comércio de ouro
dentro do embornal de couro
dos garimpos até os roçados
era ele muito aguardado

Trocou tropa pelo trem
e ao progresso disse amem
quando a ferrovia chegou
e novamente se inventou
pois dentro do seu vagão
todo, arroz, milho, feijão

Ele mesmo compraria
para vender lá na Bahia
e de lá vinha descendo
com o seu vagão trazendo
perfumes, panos, tecidos,
remédios e mil artigos

Por anos indo e vindo
fez ele seus dividendos
Casado com Terezinha
fizeram na vilazinha
seu comércio e pensão,
a maior da região.

Com a casa logo erguida
já quiseram em seguida
uma professora pra lá
para contas e beabá
ensinar pela primeira
vez para essa vila inteira

Nem tudo foi belo e bom
e num grito fora do tom
vieram os tiros de canhão
e trem, vagão e estação
já não existiam tais
e mudou-se uma vez mais

De Alfredo Graça pegaram
o último trem e pararam
na cidade de Teofilo Otoni
e eles sofreram ali
a triste separação
em nome da educação

De todos os seus filhos
Natalino foi nos trilhos
de volta para a fazenda
de seus pais numa contenda
lá para as margens do Rio
Setúbal num desafio

Feira Natalina

Quando sábado chegava
Seu Natalino montava
o seu cavalo Rosi
que já sabia pra onde ir:
de Santa Cruz, sua fazenda
até a feira buscar a renda.
 
Na vila do Jenipapo
era a feira de trapo,
rapadura, porco, pinga,
panela, couve, moringa,
linguiça, milho, feijão,
gado, queijo e requeijão....
 
Natalino bom mascate
na feira dava arremate
nas pagas e encomendas
que faziam pra sua moenda
de rapadura e cachaça
enquanto andava na praça.

Anotava, em prosa lenta,
num papel de letra atenta
uma nova e boa encomenda
Parava e resolvia a contenda
dum filho querendo comer
queijo e groselha beber

 De passada lenta e aberta
andava como quem acerta
na sorte fazendo o que gosta
vivendo e vendendo a roça
que cuidava com carinho
tal pássaro do seu ninho

Essa vila orgulho lhe dava
quem dissesse não errava
do mercado até a Igreja
tinha da sua bemfazeja
cada rua cada calçada
fez com esmero de morada

 Mas não fez sozinho é certo
tinha amigos bem diletos
com quem andava e proseava
e até versos declamava
histórias de assombração
e também de lampião
 
De boa prosa e jeito calmo
foi delegado da região
de Araçuai, Jenipapo,
de Machados, Badaró,
até Córrego das Velhas,
Berilo e também Chapada
 
Era um delegado diferente
desses tipos boa gente
não mandava prender
se dava pra resolver
com conversa, com conselho
via no outro sempre um espelho

Seus olhos azuis sérios
de contador de mistérios
de troças, de escalabros
de piadas e de causos
um mundo se emocionavam
quando seus filhos chegavam

Pois estudavam bem longe
Araçuai, Teofilo Otoni
e também Belo Horizonte
mas nas férias iam pra feira
nos burros e na traseira
do seu cavalo Rosi




quarta-feira, 23 de dezembro de 2015

Flâmula

Em seu talo eu me embalo
sua menina meretriz
e se diz: ‘‘ fela me o falo’’
seu falo felo feliz

quinta-feira, 10 de dezembro de 2015

Lama

De vida, de morte
de jornada breve
Com acaso, sorte
e meu peso leve

De fome, banquete
natural, urbano,
selva,  palacete,
animal e humano

Sou chama sou brisa
pra tudo que me
refresca e atiça

Sou terra sou água
pra tudo que me
soterra e deságua

terça-feira, 8 de dezembro de 2015

Sou terra
pra tudo
que me
soterra

Sou água
pra tudo
que me
deságua

sexta-feira, 4 de dezembro de 2015

Ela

Nos enredos já se atira
nos medos sequer respira
pois me inspira seus segredos
quando pira em meus dedos

sábado, 28 de novembro de 2015

Carnavalescer

Pois se nós, reles mortais
ainda estamos em janeiro,
dezembro, junho ou mais
tristes por um ano inteiro
entre seus risos e ais

Ele bem tá em fevereiro
e vive seus carnavais
roda de samba e pandeiro
cariocando muito mais
que eu ou outro brasileiro

Pois se nós, reles mortais
vamos depois dum dia inteiro
contentes pros triviais
botecos de bom mineiro
dessas e doutras gerais

Ele, samba derradeiro
em tão doces festivais
pois no Rio de Janeiro
se carnavalece mais
de março até fevereiro

puxando papo
pedindo ixqueiro
numa ixquina
fazendo ixcola
ficando em paix