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Poeta e apenas poeta

Já me olharam espantados quando digo que sou poeta e só poeta. Que não canto, nem danço, nem atuo, nem pinto, nem bordo, que "só" ...

terça-feira, 22 de abril de 2025

A madrugada urge

A madrugada urge 
para os que dormem
e os que fazem poesia 
procuram o verso
perfeito
antes de serem 
descobertos
pelo sol

É no silêncio soluçante da noite
que a rima encontra
o tema e encarna a trema
abolida dos dicionários

A sirene que rasga o breu
sobressalta os bebês 
a acalenta os poetas
que não se sentem sós
nessa dor de quase morte
do verso não nascido
da vida não parida
e o que mais?

O que mais nada
venenos noturnos
fim de estrada 
penúltimo verso 
e mais nada.

domingo, 20 de abril de 2025

Livro, memória tangível da humanidade

O que é o livro? O que é este objeto que há séculos permeia o cotidiano dos saberes e memórias da humanidade? Como ele surge, do que é feito e como ele afeta a própria noção de quem e como somos? Não há aqui a pretensão de responder essa e nem outras perguntas que surgirão no decorrer deste ensaio, mas sim passear pela historicidade desse objeto que torna tangível a memória, que grava a fala e seus ditos, congelando-os em seu próprio lugar no tempo e no espaço.

Segundo o escritor argentino Jorge Luis Borges, o livro é um assombroso instrumento criado pelo homem para ser uma extensão de sua memória e de sua imaginação. Seu advento resulta de uma série de invenções humanas voltadas ao desejo de perenizar a memória, a criação e as formas de significar e compreender o mundo. Esse anseio por eternidade é anterior tanto ao livro quanto à escrita. Não por acaso, tantos cantos sagrados como o Gita, a Ilíada, a Odisseia e o Beowulf foram transmitidos originalmente por meio dos versos. 

A oralidade, forma primeira da comunicabilidade humana, preservou por séculos as tramas fundadoras dos povos por meio de recursos mnemônicos: a métrica e o ritmo cadenciado asseguravam que toda a cosmogonia de uma cultura fosse retida e transmitida. Antes da escrita, era a alternância marcada de sílabas átonas e tônicas, breves e longas, que sustentava a mnemonia — a memória, em grego. A escrita, inicialmente em tabuletas de barro, madeira ou pedra, depois em rolos de papiro, pergaminho e couro, e finalmente em códices, passou a substituir progressivamente o movimento da oralidade pela fixação da palavra escrita. Seria, pois o livro anterior a própria escrita? E as cadências rítmicas dos versos clássicos uma espécie de primeira forma de registro de um livro ainda que imaterial?  Ou é na gênese da escrita, inegavelmente, a origem do próprio livro, afinal sua tangibilidade, materialidade física são condições para sua perfectibilidade?

O livro ocupa um lugar singular entre os inventos do intelecto humano, pois molda a própria noção do ser, sua percepção de si mesmo e do mundo que o cerca. Segundo Vilém Flusser, em A Escrita: há futuro para a escrita?, a escrita não sofre da mutabilidade essencial da oralidade. Por isso, permite que o conceito de história seja fundado: o mito é atualizado a cada vez que é cantado, enquanto o texto, uma vez fixado, narra não apenas um enredo, mas testemunha o tempo em que foi escrito. O livro e a escrita introduzem uma nova percepção temporal: em vez da repetição cíclica dos mitos, instauram a sucessão linear dos acontecimentos. Em seu Soneto 234 Confessional, Glauco Mattoso canta: “Palavra voa, escrito permanece, / garante o adágio vindo do latim. / Escrito é que nem ódio, só envelhece.” O livro, portanto, não possui a vivacidade da voz, mas tem a eternidade como sua maior aliada — e com ela, a capacidade de registrar e atravessar o tempo. Seria essa a razão pela qual o livro é definido por sua tangibilidade? Por sua permanência ao longo do tempo se não de maneira imutável mas de uma maneira cuja sua mutabilidade possa ser percebida? Os concílios católicos que elegeram os livros canônicos são um registro de uma mutabilidade e assim distinta daquela mutabilidade do mito que se altera e alterna com o passar dos cantos de geração em geração sem que sua forma anterior tenha de fato um registro que um dia existiu.

Homero talvez fosse uma singularização dos homeridas, os aedos que, ao longo dos séculos pré-escrita, compuseram e transmitiram seus cantos até que estes fossem fixados com o advento da escrita. Por séculos, a ficção circulou em um regime em que a autoria não era relevante: só com a imprensa é que a identificação dos autores passou a ser exigida, tanto pelos dividendos quanto pela responsabilização dos conteúdos. Até então, apenas os textos dedicados à Verdade — como os sagrados, filosóficos e teológicos — exigiam autoria, pois carregavam a autoridade e o testemunho de quem os escrevia. Com a evolução da imprensa e a revolução técnico-científica, essa relação se inverteu: os textos autorais tornaram-se, em sua maioria, aqueles que os gregos chamariam de mímesis, enquanto os textos voltados à aletheia passaram a ser coletivizados. A academia moderna já não vê a mesma validade em uma única voz: no texto científico, o poder está no respaldo coletivo, na comunidade que atesta e valida o discurso. Entretanto, na contemporaneidade, aparece um novo apagamento da autoria: inteligências artificiais, fake news e a reprodutibilidade técnica tornaram banal a cópia, a mescla e a mixagem de textos e ideias de distintas fontes. A autoria já não é o centro da preocupação — assistimos, talvez, a um retorno à fluidez pré-imprensa. Se no século XX Barthes declarou a morte do autor, no século XXI o próprio conceito de autoria parece estar em perigo. 

Estaria a própria tangibilidade do livro também em perigo neste século? O livro, transformado em códigos, transcritos em bytes e projetados em uma tela de LCD é o mesmo livro que era quando escrito em papiros de juta, em pergaminhos de couro ou códices de papel em que o leitor podia percorrer com os dedos, anotar nos cantos ou até rasgar uma página que estava ali no alcance das pontas de seus dedos? Assim como o conceito de autor, a figura do leitor também se transforma ao longo da história. Nos cantos da antiguidade, a leitura era coletiva, oral, performática — e a distinção entre autor e leitor era tênue, quase inexistente. Um povo era, ao mesmo tempo, criador e transmissor de suas narrativas. Na tradição grega, o texto era entoado em público; na Idade Média, passou a ser murmurado, num sussurro entre os lábios. Apenas na modernidade a leitura silenciosa se tornou a norma, marcando o início de uma experiência íntima e individual com o livro. 

Clarice Lispector, no conto Felicidade Clandestina, sintetiza essa relação com rara precisão: “Não era mais uma menina com um livro: era uma mulher com seu amante.” A leitura, na contemporaneidade, deixa de ser partilha comunitária e se torna experiência solitária e amorosa, revelando o quanto o livro passou a habitar os domínios mais profundos da subjetividade humana.  E um livro, que não pode ser mais tocado como antes na tela de um Kindle, pode garantir que a menina se transforme em mulher como descrita por Clarice? Decerto que o apego às letras digitais será distinto daquele que tocava a tinta sobre o papel e nele podia marcar com sua própria grafia, porém a mutabilidade do livro é capaz de encontrar novas maneiras de se adaptar a relação do leitor e do livro para seu constante e novo momento.

Eis que, nesse jogo temporal, surge o jugo do editor — figura que assume múltiplas formas e funções ao longo da história. Desde aqueles que primeiro fixaram os mitos em linguagem escrita, passando pelos bibliotecários de Alexandria, que uniformizaram versões divergentes de obras, elegendo as que se tornariam definitivas. Mais tarde, os membros dos concílios católicos determinaram, séculos após o surgimento das escrituras, quais livros comporiam a versão canônica da Bíblia,  No século XIX, os editores de jornais moldaram a narrativa dos romances folhetinescos, publicando-os em capítulos com vistas à venda da maior tiragem possível. Hoje, o editor se transforma novamente, é uma peça dentro da estrutura do mercado editorial de eventos como a FLIP e as Bienais do Livro, mas também lidando com os desafios impostos pelos algoritmos que governam o fluxo de textos nas redes, com base em critérios tão imperscrutáveis e obscuros quanto aqueles que condenaram como apócrifos tantos textos durante o medievo.

 Em uma sociedade ágrafa, as técnicas mnemônicas eram o único meio possível de preservar a memória coletiva. Por isso, eram reservadas às obras fundamentais — os mitos que compunham a identidade e a cosmogonia de cada povo. Nesse contexto, a predominância dos épicos era absoluta: sua forma fixa e poética, estruturada por métrica e ritmo, permitia a preservação de narrativas com centenas de versos. Com o advento da escrita, o dispêndio de recursos para conservar tais obras foi drasticamente reduzido. Já não era necessário treinar aedos por toda uma vida para garantir a sobrevivência dos textos sagrados. Ainda em versos, mas agora libertos da necessidade exclusiva de memorização, começaram a circular também as comédias, as tragédias e a poesia lírica — além, é claro, de toda a produção filosófica de seu tempo.

Com os copistas medievais, a produção e preservação de textos alcançou um novo patamar, permitindo que as cantigas populares — de escárnio, de amigo e de maldizer — também fossem registradas para além da memória oral. Mais tarde, com a evolução das técnicas de impressão, a partir dos rudimentos da xilogravura e de outras formas correlatas, uma nova revolução se instaurou. As técnicas mnemônicas, outrora essenciais, passaram a perder espaço progressivamente. Nesse novo contexto, a prosa começou a se destacar entre as grandes obras nacionais, como é o caso de Dom Quixote, de Miguel de Cervantes.

No auge da Belle Époque, é a evolução das técnicas tipográficas que permite ao outrora sonetista Mallarmé tornar-se precursor e inspiração para diversos movimentos literários, especialmente com sua obra Um lance de dados jamais abolirá o acaso. Se por séculos a poesia ocupou o lugar de gênero maior da literatura, no século XX, com o advento das máquinas offset e da impressão digital, a prosa firma sua hegemonia — um processo que o século anterior já prenunciava. Os movimentos modernistas abraçam o verso livre e sua autonomia em relação às técnicas mnemônicas, numa era marcada pela plena instauração da reprodutibilidade técnica. A popularização de novas tecnologias possibilita o surgimento de movimentos como o Concretismo e o OULIPO, que exploram os limites da linguagem por meio do domínio dos aparatos que a ciência oferece. Já o século XXI se apresenta com uma miríade de formas de fixação da memória: o livro assume formatos digitais, podem ser lidos em tablets, celulares, notebooks, e e-readers. Os textos transitam à velocidade da luz pelas redes de computadores, e os meios de publicação e produção textual tornam-se acessíveis de um modo que nenhum dos autores dos textos sagrados poderia sequer imaginar. 

As condições materiais do livro foram determinantes na transformação dos paradigmas que envolvem sua concepção, autoria, edição e recepção. À medida que as técnicas de produção, circulação e preservação da escrita evoluem, alteram-se também os modos de escrita e leitura possíveis. O estilo, a linguagem e mesmo os gêneros literários moldam-se às possibilidades e limitações oferecidas por cada suporte. Compreender a história dessas transformações técnicas é essencial para entender como a linguagem não apenas se adequa, mas se funde às materialidades de sua época, formando com elas um amálgama indissociável entre forma e matéria.

 

terça-feira, 8 de abril de 2025

Pentágono Mágico de 5⁵ cantos

Te tenho tentado
calado num riso
do certo e errado
no peito ferido
amor proclamado

Te tenho contado
medido, preciso
e cronometrado
fazendo registro
de todo passado

Te tenho cobrado
tentado teu ciso
governo e estado
valendo teu guiso
presente embalado

Te tenho marcado
por onde te piso
de faca e de fado
de dentro do ouvido
teu endiabrado

Te tenho cuidado
cuidado te aviso
quebrado no quadro
confesso mentindo
todo apaixonado 

segunda-feira, 31 de março de 2025

Por seu paladar

Resoluta, Bianca saiu de sua morada e escolheu, depois de muito procurar, o espécime pretendido entre os mais saudáveis, belos e de macia carne. A caça não era de modo algum escassa e ela também não tinha qualquer pressa. Aguardou até que o espécime ideal lhe cruzasse o caminho. O abate foi fácil, fácil demais, quase um tédio pela expectativa que tinha de antemão. Mais trabalho teve para higienizar as unhas de todos os resíduos. Mas o cheiro, o cheiro era exatamente aquele que se lembrava.

Mesmo sem o hábito não teve dificuldades para limpá-lo e separar os cortes mais nobres. Dispensou os ossos, nervos, vísceras, sebos e as partes de segunda categoria. Só lhe interessava os cortes mais nobres acondicionados, enfim, em seu refrigerador. Exceto o primeiro corte que reservou e o deixou descansar no varal de sua lavanderia. Quando retornou sorriu ao ver sua peça, escolhida com muito esmero, coberta e já semeada pelos ovos sarcófagos. 

Estava feito e ela pôde sair em busca de mais. Do mercado local trouxe legumes e hortaliças. Do empório trouxe uma especiaria eslava que sequer saberia pronunciar. Chegado o momento fatiou as cebolas roxas e brancas, rasgou o hortelã e picou o alho-poró e os pimentões amarelos, vermelhos e verdes. Do corte do varal pinçou todas as iguarias verminosas e prontas para o consumo. De um segundo corte, refrigerado, seccionou um bife de três dedos de altura, como rezavam as cartilhas dos melhores chefes internacionais.

Em fogo forte azeitou a frigideira e acrescentou dois dedos de manteiga para dar um toque francês. Então, adicionou cada item preparado, do mais sólido ao mais tenro, à frigideira apreciando cada chiado e pacientemente conduziu a reação de Maillard pois queria todo aquele contraste dourado da superficie com seu interior sanguíneo. O sol morria, vermelho, lá fora quando o tempero do leste europeu, ocre e terroso, deu o último toque. Era uma receita antiga, emanava uma fragrância que invadia todos os lares de sua vizinhança. Orgulhosa imaginava do porteiro à vizinha do andar de cima salivando por seus dotes culinários.

Finalizada a cocção, posta a mesa e servido seu prato, percebeu que sua taça repousava vazia sobre a mesa. Praguejou, irritada, por seu esquecimento do acompanhamento mais pertinente. Rangeu a cadeira, circundiu a mesa e a sala, destrancou a tetrachave, passou pela porta principal e foi, em passadas apressadas, à padaria preferida comprar coca-cola.

domingo, 30 de março de 2025

Quadrado mágico de 4⁴ cantos

Subindo a serra
num turbilhão 
que logo inverna
seu alazão 

Descendo a terra
nesse estradão 
de pé, de perna
pra ter seu pão 

Prevendo a guerra
pro seu canhão 
numa caserna
ter o quinhão 

Sabendo que erra
e tudo é vão 
sem vida eterna
e sem razão 

sexta-feira, 28 de março de 2025

300ml

Eu e minha boca,
meus pés doloridos 
Tomando uma só 
num bar de sinuca
me sinto tão só 
triste na tristeza
que não acaba nunca

terça-feira, 25 de março de 2025

Triângulo magico de 3³ cantos

Feito festa
cai o gato
na cidade

Feito lua
ladra o lobo
na floresta

Feito luto
roi o rato
no porão

domingo, 2 de março de 2025

Tragédia bibliotecária


Zelosa, ela vivia entre estantes, prateleiras e fichas catalográficas.  Piso em falso ou terremoto? Não se sabe, mas sob livros, fora soterrada, morta e coberta de razão..

domingo, 16 de fevereiro de 2025

Nunca mais café

Mulher feita e dona
do próprio nariz
Disse resoluta 
que ela nunca mais
serviria café
Comprou uma chaleira

sexta-feira, 31 de janeiro de 2025

Poetautista

Pergunto com verso
quem disse que tem
só essa ou aquela
maneira de brincar?

alinho brinquedos
como uma criança 
no chão do meu quarto 
escrevo poemas

alguns por tamanho 
outros pela cor
arestas co'arestas
rodas com os pés

meu jeito, meu verso 
brinquedos-palavras
tão inesperadas
no modo de usar

Nestas teclas


Os seus dedos
longos languidos
e angulares
eram todos
delicados
 
tão suaves
que apagavam
meus pesares
pensamentos
singulares

poética
em seus sons
e meus sonhos
os seus dedos
sobre mim

quarta-feira, 29 de janeiro de 2025

Djeina

quase dói 
quando sinto
não me sento
no banheiro
porque tenho
medo do eco
desta lágrima
nesta chuva 
no chuveiro

segunda-feira, 20 de janeiro de 2025

SteamPunk Fantasy em cinco palavras

 Raivosas ovelhas luditas quebram teares.

quarta-feira, 8 de janeiro de 2025

Sem fingir costume

Mote: “escovar a história a contrapelo” Walter Benjamin

Atento, com olhos semiabertos,
como quem penteia a memória 
o filósofo cata os piolhos
das verdades meias e inteiras

Entre ser monge ou barbeiro
hábito e manto contra pelos 
Entre o padre e a prostituta 
há seus pedidos de joelhos

A cada deus, a própria prece
que sonha com seu paraíso
profano, divino ou terrestre
cada qual feito por um juízo 

O sagrado só o é entre aqueles 
que comungam da mesma fé
seus segredos, seus votos, são 
pros devotos e nada mais 

quarta-feira, 1 de janeiro de 2025

Quanto vale a poesia?

Pode me propor:
moeda, pix, nota...
o importante é a troca
e não o valor!

quinta-feira, 26 de dezembro de 2024

Duplo trocadilho

Um pinguim
de cartola 
sobre minha 
geladeira

domingo, 22 de dezembro de 2024

sobre a brevidade da vida

Vá se foder Sêneca
a vida é uma vadia
uma vadia escrota
que para a punheta
que você não pediu
antes de você gozar

sábado, 21 de dezembro de 2024

Defeso, denegado e dissuadido

Da cobertura do arranha-céu, entre cédulas, títulos e debêntures, o CEO, abatido, caiu direto na calçada. 

De terno e gravata, causou espanto estatelado no chão.  Sirenes, viaturas, cordão de isolamento e fechamento do ano fiscal.

Dispensado o socorro, estava morto e aferido o lucro e o dividendo, afinal, óbito também é alta.

sexta-feira, 20 de dezembro de 2024

Vaidade

melhor um fracasso
retumbante do que 
sucesso qualquer
só e silencioso?

terça-feira, 12 de novembro de 2024

sexta-feira, 8 de novembro de 2024

Aldravia Baudeleriana

Igualmente 
Embriagam
Vinho
Vício
Verso
Virtude

quinta-feira, 7 de novembro de 2024

QUADRILHA MEXICO-SOVIETICA

Diego amava Rivera
que amava Kahlo
que amava Chavela 
que amava Frida
que amava Trotsky 
que amava Sheridan
que amava Leon 
que amava Sedova
que era revolucionária também.

Rivera foi para os Estados Unidos, 
Sheridan foi exilada,
Frida sofreu de desastre, 
Kahlo casou-se com Diego,
foi amante de Leon e Chavela, 
que tornou-se alcoólatra,
Sedova casou com Trotsky 
morto por J. Ramón Mercader
que ainda não tinha entrado pra história.

sexta-feira, 1 de novembro de 2024

Tropicália concreta

cintilava a lua
quando o cão caetaneava
o guarda de mijo

quinta-feira, 31 de outubro de 2024

riacho

satisfeita a velha

lava o lençol da donzela

sangue e primavera 

quinta-feira, 24 de outubro de 2024

Veneno antigo

Esse frasco de cicuta

são as promessas que fiz

pra mim mesmo sem saber

que matariam devagar 

meu eu, meu sonho e sentido

pouco bem pouco por vez


Não sei se sei dizer quantas 

promessas ainda carrego

por zelo como amuletos.

   Quebro com carinho,

   dos cacos faço um mosaico 

   pra luz entrar sem perigo 


Não sei dizer porquê ainda honro

e prossigo na vingança

silenciosa contra meu passado

   Quebro, enfim, a caixa preta

   e hasteio bandeira branca

   pra mim pois não há inimigos


Eu sei bem daquelas tantas,

que jurei só com meu pranto,

por dores hoje esquecidas

   Quebro em silêncio e grito 

   o que me prende ou afasta 

   do meu sonho e meu sentido


Dos crimes sem ser culpado 

carrego essas juras cúmplice

e penitente as mantenho

   Quebro essas minhas correntes

   Com o formão e o martelo

   pra esculpir a liberdade 

terça-feira, 22 de outubro de 2024

Sinto

o gosto o cheiro das uvas
o tonteio e o embaraço 
Ah! como lhe quero rubra
e nua dentre meus braços

segunda-feira, 21 de outubro de 2024

Prelúdio

Remido fasol mido
Remido sol famido 
Resolmi do lafami
do lafami resolmi

Si solre do famisol
Si solre do mifasol
Remido fa ladomi
Refado mi soldomi

A pianista dizia
no mifasol domi todo
amor ladomi que sentia 

e o poeta remido 
Solfejava em redondilha 
de do re mi até do

sexta-feira, 18 de outubro de 2024

Poeta Sobre Trilhos

sim senhor doutor 
minha terapia
é ir pro metrô 
vender poesia

quinta-feira, 10 de outubro de 2024

Haicai Xadrez Zoológico

ocaso ecocida

morrem os grandes felinos

de gripe aviária

quarta-feira, 9 de outubro de 2024

História dos livretos Poeta Sobre Trilhos

São 31 edições, trinta e um livretos do Poeta Sobre Trilhos. São livretos que produzo desde 2011 e levo nos vagões de trens e metrôs do Brasil. Comecei, é verdade, no Rio de Janeiro, saindo de Caxias até Bonsucesso, onde pegava o expresso para a Ilha do Fundão, mas já fiz incursões no metrô paulistano, saindo da estação Tietê até baldear na estação da Luz e ir para São Cristóvão. Hoje, de volta aos meus belos horizontes, vou da Vilarinho até o Eldorado.

São muitos os caminhos que já percorri sobre trilhos, levando poesia, levando meus versos para tanta gente que não sabia que gostava do prazer que um poema pode nos dar. Minhas primeiras edições se chamavam "Sr. Personna, o que trazes pra mim?" Eu imprimia, xerocava, dobrava e grampeava um por um, fazendo em levas de 20, depois 50, depois 100, depois 200, até que comecei a mandar para a gráfica fazer seus 1.000, depois 2.000, ainda em preto e branco e papel sulfite.

Mas dei um salto quando consegui um lugar para fazer mais barato, colorido e com tiragem de 2.500 exemplares na edição 13, que então em seguida foi rebatizado de Poeta Sobre Trilhos, já no ano de 2012. Com esse novo formato, fiquei por muitas e muitas edições coloridas, em papel couchê e produção industrial. Até a edição 28, em 2016, quando caí em depressão e diminui meu ritmo, fazendo a edição 29 em 2017 e a edição 30 em 2019.

Veio então a pandemia, e com ela deixei definitivamente o Rio de Janeiro. Voltei aos belos horizontes em 2020 e toquei meus dias longe dos trilhos por quatro anos.

Em 2024, sentia um vazio no peito, sentia falta de algo, e esse algo não era só escrever, pois continuei nesses anos todos alimentando meu blog srpersonna.com.br com poemas, crônicas, contos e ensaios. Esse algo era o prazer de ver o leitor me lendo à minha frente, mostrando seu poema favorito para outro leitor ao seu lado, declamando meus versos para a namorada e até se emocionando com o que lia.

Fiz então a edição número 31, que, 13 anos após a primeira, me deu um sopro de vida e propósito, me encheu o depósito de lirismo e esperança que andava tão vazio em mim. Ter de volta esse contato íntimo com o leitor me fez mais vivo, me inspirou e conseguiu me tirar de um luto que parecia não ter fim.

Sinto que o bem que eu faço para os leitores não é maior do que o bem que eles fazem por mim. O importante não é o dinheiro, é essa troca íntima e confidente que poucos artistas têm acesso, entre o público real e o poeta. Só quero agradecer por estar de volta como Poeta Sobre Trilhos; esse é meu lugar, de onde eu nunca deveria ter saído.

domingo, 6 de outubro de 2024

Haiquase carente

Sem seu cabelo

amadrugada é longa

como travesseiro

quarta-feira, 2 de outubro de 2024

segunda sem motivo


SEGUNDA SEM MOTIVO
ME MOVO MEIO MANCO
E TRISTE TOMO CAFÉ
SEM AÇÚCAR SEM SAL
O PÃO ME ACOMPANHA
MURCHO SEM RECHEIO
E NO MEIO ME FALTA
UM POUCO BEM POUCO
DE TUDO QUE ME RIO
DOU ADEUS PRA CAMA
LONGUÍSSIMA SEMANA
NUMA MESMA CAPITAL
DONDE NASCI E IREI
MORRER DIA DE CADA
VEZ QUE PASSO NUMA
PRESSA SEM PROSEAR
SEM NEM SEQUER VER
QUE RAIA NOSSO SOL
ENTRE FUMAÇA PRETA
E TRÂNSITO CAÓTICO
TRABALHO E ESPALHO
MEU RESTO DE FORÇA
QUE ME RENEGA ESSA
SEGUNDA SEM MOTIVO

quarta-feira, 18 de setembro de 2024

O belo como moldura da violência

A arte deixou de ter seu sentido latino de técnica; porém, ainda é comum vermos todo artista e sua obra como um exemplar indissociável da Areté grega, como um exemplo do ápice do humano. Os padrões rígidos do que é arte se dissolveram e, hoje, Arte é a moldura na qual canonizamos o artista.

A arte é moldura, ou seja, aquilo que, através do uso discursivo, classificamos como produção artística, a despeito da técnica. É na moldura que consideramos a intencionalidade do sujeito quando o mesmo se enquadra em nosso construto de sujeito ocidental, branco, neurotípico e cristão, e o ignoramos quando desviante.

A moldura da arte cai bem para os quadros em série feitos sob encomenda para as galerias, os livros em série para serem bestsellers, a escultura sob subvenção pública a despeito do público. E também é arte o que consideramos belo, a despeito do que o sujeito desviante pensa sobre seu próprio trabalho.

Porém, o belo não é monopólio da arte, e muito menos seu objeto central. Quando, atraídos pelo belo, chamamos de arte o sagrado dos povos originários ou a profissão de fé de um homem preso por sua própria mente e também pelo Estado, estamos cometendo uma violência contra a autonomia desses sujeitos, cujas obras de inegável beleza não possuem a intencionalidade de serem arte. É uma violência simbólica dissociar esses objetos de seu uso para atender a um discurso alheio aos sujeitos e assim emoldurá-los como arte.

Ademais, desprezamos a arte que não possui o predicado de belo quando concebida pelos sujeitos à margem da moldura discursiva padrão. Quando o desviante ofende o senso estético de quem dita ao que se deve conceder a moldura de arte, temos outra violência, que nega novamente a autonomia do sujeito e de seu entorno, que percebem como arte o que fazem e vivem.

Entretanto, a moldura de arte é apressadamente posta em um objeto que, mesmo carecendo de técnica ou empenho estético, é produzido por um sujeito elencado como digno da Areté para o nosso discurso ocidental contemporâneo. Há aqui uma culpa de séculos, pois essa cultura chamou de lixo a arte de Van Gogh e, por isso, hoje chama de arte qualquer lixo produzido pelo sujeito adequado, para não se comprometer com as gerações futuras.

O zine de poesia "independente", a música "experimental" e o quadro "indecifrável" são obras igualmente criticáveis, independentemente de seu autor ser do morro ou do asfalto. Criticar um poema, ou pior, criticar um poeta tornou-se uma espécie de pecado capital. Não entender um poema ou deixar de aplaudir uma produção medíocre idem. Não há espaço para se preocupar com a forma, com o estilo; somente importa o que se faz sentir, o que provoca e encanta.

Parafraseando Gertrude Stein: um lixo é um lixo é um lixo é um lixo, e é preciso ter coragem de dizê-lo. É preciso ferir o Narciso de cada artista emoldurado, assim como é necessário quebrar a moldura que violenta o sujeito e sua obra, que são autônomos ao próprio conceito de arte ocidental, ou roubar as molduras para as artes que são marginalizadas.

Devolvamos as açoiabas aos Tupinambás, devolvamos os estandartes do Bispo do Rosário e botemos toda a arte para reciclar suas obras, artistas, molduras e conceitos, pois a arte merece mais que ser crivada como comércio ou desculpa para culpas passadas.

domingo, 15 de setembro de 2024

Xepa


Sempre fui da xepa da promoção e da pechincha, comprei meu coração na barraca de um e noventa e nove.

Porém meu peito e pulmão, pobres e expropriados, fizeram fiado.   Eles penduraram a conta pra minha garganta pagar sob protestos.

Por solidariedade a boca fez greve não queria o novo e vermelho inquilino: piquete montado, dentes  trincados...

Mas a mão furou, pelega, não era de esquerda. Furado o piquete o coração caiu na barriga, burguesa, de tão gorda se fez de sonsa e não quis devolver, foi briga das feias, minhas velhas veias tiveram que intervir:

GREVE GERAL e o general da cabeça, prefeito não eleito do meu corpo, entrou em febre, uma convulsão social. Reintegração de posse, biles, vômito e rebordose, mitocôndrias em pânico ouviam a internacional!

Eu feito latifúndio improdutivo, fui numa noite  tomado por uma princesa  socialista, que encampou meu corpo, pôs meu coração no peito, deu um jeito nos grevistas e botou de regime minha barriga.

E todos, em todas as partes, pedaços, ossos,    órgãos,     células,   culturas    bacterianas   e   tártaros superbacanas  puseram abaixo a superestrutura.

Era a revolução e de agora em diante. Todos, todos, teriam o direito Inalienável ao pão,  à poesia e, é claro, aos beijos dela.

segunda-feira, 9 de setembro de 2024

domingo, 8 de setembro de 2024

Écfrase Alexandrina

Eu tô com cara de poeta vagabundo?
Justo! Não quero jamais confundir meu público:
cabelo bagunçado e cavanhaque inculto
aro redondo pros olhos e peito impúdico.

Pelo espelho destaca o gosto tatuando
em minha perna eis coxa eis ninfa e sátiro
dançando na gravura indecente prum culto 
a Dionísio que logo acima sobe ao púlpito 

No braço como num abraço meus asseclas
sacerdotes se brindam num banquete eterno 
Glauco, Hilst, Leminski, Augusto, Rosa e Siba

Colasanti, Matos, Lee, Quintana, Sergio, Sade
e o satírico Raul completam num bom termo
a volta feita na foto deste poeta 

sábado, 31 de agosto de 2024

Coreto liberdade

sussurra a voz rouca
não fique sozinha, 
com essas garrafas, 
de vinhos sem safras. 

sua linda boca, 
que não é só minha, 
beija o corpo meu, 
que não é só seu.


Belo Horizonte, Julho de 2002

quinta-feira, 29 de agosto de 2024

Cyberpunk em 5 palavras:

I)
Implantaram um coração num Bilionário 

II)
Porcos corporativos dão melhores hambúrgueres 

III)
Televangelista enforcado nas tripas corporativas

quarta-feira, 28 de agosto de 2024

Vestido azul

 Quero dedilhar meus dedos
quero-os em ti mergulhados
Nadando dum lado ao outro 
no seu mar e rio revoltos

Quero ser abocanhado
pouco a pouco degustado
pelos seus lábios a postos
pra provar-me todos gostos

Em riste rijo te rasgo 
esse poema devasso
essa cantiga perversa 

Pois me inspira quando pira
quando arfa, rosna, delira,
devora (ou vice e versa)

domingo, 25 de agosto de 2024

Poeta,

por favor,

só empilhar

palavras

não se faz

poesia.


sua prosa,

na vertical,

não se vira

um poema

só por isso.


não só leia,

ouça a voz

fale escute

o seu ritmo

verso é som


por favor,

só empilhar

palavras

não se faz

poesia.

quinta-feira, 22 de agosto de 2024

Sci-fi em 5 palavras:

I)

no céu a terra cintilava


II)

pálido ponto azul, nunca mais 


III)

Rápido, siga aquele táxi voador! 

terça-feira, 6 de agosto de 2024

Dos delírios e deleites

paciente pela florada,
de lírios e copos de leite,
ele, dia a dia, regava,
gentil, os seios da amada
com o seu sêmen e saliva...

quinta-feira, 1 de agosto de 2024

Quarenta e sete segundos

Pro inferno no mais baixo dos seus círculos
é o ponto exato que eu ia se nisso

eu de fato pudesse crer tranqüilo

sem chance de galhofas ou de risos


Tranço e destranço as cordas do suicídio

como quem reza as contas de seu terço

num vício mui macabro e bem ridículo

e cada nó me vale um pé de verso


Pois não vou me orgulhar de ser ateu

você que tem um deus é mais astuto

co'amigo imaginário pra brincar


O que vai me esperar é qualquer breu

um grão-nada tão calmo, absoluto

que da música não posso reclamar

quarta-feira, 31 de julho de 2024

Prece para ti

Quero o descalabro
De ter cada canto
De ti devastado
Numa fome e espanto

Quero ungir seu rabo
Com meu óleo santo
Pra levar a cabo
Seu orgasmo e pranto

Quero lhe causar
Deliciosas dores
Com prazer imundo

Posta em meu altar
De amarras e flores
Num jardim fecundo

quarta-feira, 24 de julho de 2024

O papel aceita tudo

É poesia! Liberdade!
Lirismo em flor e cio?
Não! não passa de vaidade...
feita de verso vazio.

O papel aceita tudo
do soneto mais profundo
ao poema mais capenga
e tem quem se surpreenda
co'a má vontade ou esforço
que quem rima rumo ao poço
dessas metáforas mortas
de tantos clichês e cartas
piegas que sem quê nem
pra quê canta pois convém
ao mau gosto o pior verso
que sem risco sai direto
da boca para a latrina
dos ouvidos e alucina:

É poesia! Liberdade!
Lirismo em flor e cio?
Não! não passa de vaidade...
feita de verso vazio.
 
O papel aceita tudo
não importa o absurdo
passa recibo e atesta
é um gênio, é poeta
a nova Creta e Parnaso 
a Ilíada de um asno
é calamidade pública
um púbis de tão impúbica
e quem publica concorda
é aplauso de claque e corda
e embebeda o ego, mata
esfola, rasga e maltrata
sua musa torturada
em rima malacabada:

É poesia! Liberdade!
Lirismo em flor e cio?
Não! não passa de vaidade...
feita de verso vazio

sexta-feira, 12 de julho de 2024

Poeme-se

Poesia nas praças,
becos e avenidas.
Poesia pra ser
cantada e vestida!

Poeme-se a rua
de pedras floridas
Poeme-se os trilhos
em lenta corrida

Poema é um nada
lotado de tudo
Poema é piada
de choro profundo

Poema é queimada
inundando o mundo

sábado, 6 de julho de 2024

Sete

Sete

remexendo meus guardados
encontrei um par de estrelas
misturadas entre versos
que não sei porque escrevi
duas trovas de três versos
um sonetos sem tercetos
meio haiquase incompleto

tantos entre tanto lixo, 
e tonto entre tanto resto
a caneta que eu procurava
só deixei por lá ficar
pois por esse par de estrelas
meu lirismo não contava 
e menos ainda escandia

nesse espanto me perdi 
mas não me fiz de rogado
escondi minha vergonha
ritmando na redondilha
sete fones sete versos
pr'estrelas de sete pontas
amparadas nos meus dedos

eram elas delicadas
e trançadas com esmero
duas estrelas de brio
quente de macio toque
do meu bodoque, da lira
que delira de tão doida
poesia pura e vadia
 
duas estrelas e a quinta
estrofe em septilha cai
sem tema sem trema sem
nem ao menos respirar
é só mofo de gaveta
com gorjeta guardada
pro velho verso garçom 

sobe o tom e tira o pó
dessa poesia branca
asséptica que se lê
só com os olhos e nunca
com os ouvidos ou peito
abaixo o verso mental
quero fluxo do meu grito

meu doce agito termina
e sem rima não se manca
mas marca com fogo a língua
que repenteia meus versos
serpenteia minha boca
que surpreso ouve estrelas
e ri de encanto no lacio

sábado, 15 de junho de 2024

Virtuosa

Como um anjo estralou seus dedos, moveu de um lado ao outro seu pescoço, relaxou seus ombros e de frente ao piano pôs-se a tocar com o público às suas costas. 

Ela era virtuosa, parecia uma só com o piano, mas desde as primeiras notas, a platéia inteira hipnotizada por sua música e seu jeito de princesa sequer percebia os movimentos de seus quadris. 

Seu amor, numa hipnose dupla, sabia que aquela sinfonia sobre o banquinho era para si, o instrumento esfíncter, tocava uma melodia, leve e doce, a cada contrair e relaxar ao redor do plug. 

sexta-feira, 14 de junho de 2024

Treze estrofes sobre trilhos

Sim, lhes confesso, eu sou o que sou
sou poeta, poeta sobre trilhos
pois toda poesia não pode nunca
estar presa, trancada na gaveta

Poesia não se cabe bem guardada
escondida em biblioteca pública ou
particular nem só merecida por
quem pode pagar numa livraria

Poema é meu caminho, é meu trilho
pródigo filho feito o pai rebelde
Poema faz do riso mais que um alento
dá forças pro seu choro e canta o grito

Sim, bem atento, eu sou o que sou
sou poeta, poeta sobre trilhos
um passageiro? meu novo leitor
o vagão? livraria e biblioteca

Poesia leve levo nos vagões
do metro, do metrô ou qualquer comboio
do trem pois o poeta tira de onde
não tem para por onde não se cabe

Poema é a colher da sopa rala
do mendigo ou grossa do grã-fino
Poema vem e mata minha sede
e dá mais fome dum lirismo solto

Sim, atrevido, eu sou o que sou
sou poeta, poeta sobre trilhos
nos livretos de versos e poemas
eu me entrego sem pressa ao leitor

Poesia feito amor arde sem se ver
que até nos descontenta tão contente
e eloquente sussurra travessuras
pecados e delitos saborosos

Poema é pro dia a dia e também
para qualquer um ou para um qualquer
Poema faz seu bem querer com quem
conta seus pix, moedas ou estrelas

Sim, eu respiro, eu sou o que sou
sou poeta, poeta sobre trilhos
meu alvo? desalento passageiro 
vidrado na janela ou celular

Poesia assim tão branca como a noite
tão negra que de dia labuta versos
pintada de arco-íris ri e se oculta
num pote sempre dado de bom grado 

Poema que nos bebe quente feito
licor vermelho, rum douro ou cachaça
Poema feito faca corta a carne
do poeta, do leitor, que juntos sangram

Sim, lhes convido, eu sou o que sou
sou poeta, poeta sobre trilhos
me deito com a musa que bem me abusa 
pra dar o meu melhor e pior verso 

sábado, 8 de junho de 2024

Meu Doce

Confesso que lembrei-me com carinho
dessa forma faminta com que me toma,
que faz dessa faceira o seu cãozinho 
só seu laço e coleira que me doma

suspiro entre meu sonho e meu soninho
eu deliro e dedilho-me: me coma,
me machuca, me morda meu corpinho
eu quero ser prendada de hematomas 

Me sonho: suas mãos de doces garras
me envolvem, me atam, são fortes amarras
são tudo que desejo e que pressinto 

Sou presa por seu rosto, seu sorriso,
seu belo pinto tira meu juizo
é meu formoso e doce pirulito 

quinta-feira, 6 de junho de 2024

trova horizontina

Os mais belos horizontes 
das minhas minas gerais 
guardam suspiros aos montes 
salpicados por mil ais

sexta-feira, 17 de maio de 2024

Vês???

No alto do penhasco
cravou a Pantera
sem pressa ou asco,
garras na Quimera

No alto do penhasco
olhou a Pantera
feita de carrasco
cair a Quimera

Viu cair ingrata
o doce doce sonho 
que vil embalou

Na tristeza exata
no cigarro fez ranho
na boca escarrou

quinta-feira, 16 de maio de 2024

Poeticamente sádico

amarro bem os meus versos
e tolho cada palavra
que avulsa me vira escrava
de meus desejos perversos

gosto quando a rima crava
na carne ímpetos imersos
em taras, gozos diversos
e toda perversão rara

numa voz doce e macia
teço bem uma ilusão
de que a corda acaricia

pelas linhas da escansão
geme cada poesia
que encadeia de tesão

terça-feira, 7 de maio de 2024

Adeus Vó Cici

Nunca mais ouvirei
o canto duma cigarra
sem pensar em ti

terça-feira, 30 de abril de 2024

Coroa de Sonetos de Amor XV

moça bonita me faz seu amor
sabendo onde estão sem sequer lhes ver
nesses sonhos que são da nossa cor
o que nunca jamais vamos perder

eternidades são de um só calor
minha face na sua padecer
quero seu beijo com fogo e fulgor
tão forte que me faz quase morrer

linda não fale só faça a promessa
não! não diga mais nada só o seu sim!
é minha por inteiro tal lhe sou

não quero que se assuste nem esqueça
quero que saiba bem que como a mim
Moça bonita, nunca alguém lhe amou

segunda-feira, 29 de abril de 2024

Coroa de Sonetos de Amor XIV

moça bonita, nunca alguém lhe amou...
do tamanho do espaço sideral
digo mais, que jamais alguém beijou
seus lábios com paixão tanta ou igual

moça bonita veja bem como sou
as minhas asas são do carnaval
passado e  minha auréola apagou
não passo duma nota de três real

sou malandro nadinha de perfeito
lhe compro flor na banca duma praça
se meu atraso for mais que um horror

lhe falo sou sincero desse jeito
me xingue não, nem ligue pra essas graças
moça bonita me faz seu amor


[mo]ça bo/ni/ta, [nun]ca al/guém/ lhe a[mou...]
[do] ta/ma/nho/ do es[pa]ço/ si/de[ral]
[di]go/ mais/, que/ ja[mais] al/guém/ bei[jou]
seus [lá]bios/ com/ pai[xão] tan/ta ou/ i[gual]

[mo]ça/ bo/ni/ta [ve]ja/ bem/ co/mo [sou]
as [mi]nhas/ a/sas [são] do/ car/na[val]
pa[ssa]do e/  mi/nha au[ré]o/la a/pa[gou]
não [pa]sso/ du/ma [no]ta/ de/ três [real]

[sou] ma/lan/dro/ na[di]nha/ de/ per[feito]
lhe [com]pro/ flor/ na [ban]ca/ du/ma [praça]
se [meu] a/tra/so [for] mais/ que um/ ho[rror]

lhe [fa]lo/ sou/ sin[ce]ro/ de/sse [jeito]
me [xin]gue/ não/, nem [li]gue/ pra e/ssas [graças]
[mo]ça/ bo/ni/ta [me] faz/ seu/ a[mor]

domingo, 21 de abril de 2024

Coroa de Sonetos de Amor XIII

quero que saiba bem, tal é pra mim
só quero lhe comer. Mais? não tô afim
não podemos pular todo esse flerte
vem logo me pagar-me esse boquete?

não, não que eu seja tal pessoa ruim
mulher bonita trato bem assim
se não sabe ela nem pintar o sete
e na cama sequer rebola ou mexe

você se faz de sonsa feito porta,
espera que eu me dê todo trabalho
de desvendar aquilo que calou?

Não se faça de tonta, foi sim carta,
desde o começo, fora do baralho
moça bonita, nunca alguém lhe amou...

[que]ro/ que/ sai/ba/ [bem], tal/ é/ pra [mim]
[só] que/ro/ lhe/ co[mer.] Mais?/ não/ tô a[fim]
[não] po/de/mos/ pu[lar] to/do e/sse [flerte]
[vem] lo/go me/ pa[gar]-me e/sse/ bo[quete?]

não, [não] que eu/ se/ja [tal] pe/ssoa/ ru[im]
mu[lher] bo/ni/ta [tra]to /bem/ a[ssim]
se [não] sa/be e/la [nem] pin/tar/ o [se]te
e [na] ca/ma/ se[quer] re/bo/la ou [mexe]

vo[cê] se/ faz/ de [son]sa/ fei/to [porta,]
es[pe]ra/ que eu/ me [dê] to/do/ tra[balho]
de [des]ven/dar/ a[qui]lo/ que/ ca[lou?]

[Não] se/ fa/ça/ de [ton]ta,/ foi/ sim [carta,]
[des]de o/ co/me/ço, [fo]ra /do/ ba[ralho]
[mo]ça bo/ni/ta, [nun]ca al/guém/ lhe a[mou...] 

sábado, 20 de abril de 2024

Coroa de Sonetos de Amor XII

não quero que se assuste nem esqueça
pois com meus gesto cheios de rudeza
eu quero lhe dizer que minha pressa
é o tanto que minh'alma lhe deseja

antes que nessa mente os medos teça
sente e beba comigo um vinho à mesa
sinta o sabor do aroma nessa taça
cada gota é toda uma represa

você, meu vinho mais inebriante
sabor macio, com toque de carvalho
delícia de não ter começo ou fim

mais uma taça, brinde dos amantes
desse amor eu lhe quero, eu me embalo
quero que saiba bem, tal é pra mim


não [que]ro /que/ se a[ssus]te/ nem/ es[queça]
pois [com] meus/ ges/to [chei]os/ de/ ru[deza]
eu [que]ro/ lhe/ di[zer] que/ mi/nha [pressa]
é o [tan]to/ que/ min[h'al]ma /lhe/ de/[seja]

[an]tes/ que/ ne/ssa [men]te os/ me/dos [teça]
[sen]te e /be/ba/ co[mi]go um/ vin/ho à/ [mesa]
[sin]ta o/ sa/bor/ do a[ro]ma/ ne/ssa [taça]
[ca]da/ go/ta/ é [to]da u/ma/ re[presa]

vo[cê], meu/ vi/nho [mais] i/ne/bri[ante]
sa[bor] ma/cio,/ com [to]que/ de/ car[valho]
de[lí]cia /de /não [ter] co/me/ço ou [fim]

[mais] u/ma/ ta/ça, [brin]de/ dos/ a[mantes]
[de]sse a/mor/ eu lhe [que]ro, eu me em[balo]
[que]ro/ que/ sai/ba/ [bem], tal/ é/ pra [mim]

quinta-feira, 11 de abril de 2024

Coroa de Sonetos de Amor XI

é minha por inteiro tal lhe sou
e desde que meu lábio lhe provou
jamais esqueci dessa tecitura
faminta e forte feita de tortura

a pele sua marca um deus que errou
tecendo-lhe asas de anjo em pleno vôo
zelando por seu corpo com doçura
cantando-me por toda mente impura

farei-lhe, dos meus reinos, a princesa
terá tudo que sonha apenas peça
será banquete em farta e bela mesa

o sonho enamorado, essa promessa,
do seu lado se faz nossa certeza
não quero que se assuste nem esqueça


é [mi]nha/ por/ in[tei]ro/ tal/ lhe [sou]
e [des]de/ que/ meu [lá]bio/ lhe/ pro[vou]
ja[mais] es/que/ci [de]ssa /te/ci[tura]
fa[min]ta e/ for/te [fei]ta/ de/ tor[tura]

a [pe]le/ su/a [mar]ca um/ deus/ que e[rrou]
te[cen]do/-lhe a/sas [de an]jo em/ ple/no [vôo]
ze[lan]do/ por/ seu [cor]po/ com/ do[çura]
can[tan]do/-me /por [to]da/ men/te im[pura]

fa[rei]-lhe/, dos/ meus [rei]nos,/ a /prin[cesa]
te[rá] tu/do/ que [so]nha a/pe/nas [peça]
se[rá] ban/que/te em [far]ta e/ be/la [mesa]

o [so]nho e/na/mo[ra]do, e/ssa/ pro[messa],
do [seu] la/do /se [faz] no/ssa/ cer[teza]
não [que]ro /que/ se a[ssus]te/ nem/ es[queça]

quarta-feira, 27 de março de 2024

Coroa de Sonetos de Amor X

não! não diga mais nada só o seu sim!
sua boca velada, seu suspiro
são respostas que quero para mim
a mais doce miragem que prefiro

não! não conto os segundos para o fim
mas você bem que sabe que sou Sátiro
e sou apenas sonho sem cetim
pois eu que tanto curo também firo.

nos marco, uno, nos faço por completo
e vejo você espelho, minha igual
com quem de olhos fechados sempre vou

fazemos esse par mais que seleto
ninfa e fauno de todo carnaval
é minha por inteiro tal lhe sou

[não!] não/ di/ga/ mais [na]da/ só o/ seu [sim!]
su[a] bo/ca/ ve[la]da,/ seu/ sus[piro]
[são] res/pos/tas/ que [que]ro/ pa/ra [mim]
a [mais] do/ce/ mi[ra]gem/ que/ pre[firo]

[não!] não/ con/to os/ se[gun]dos/ pa/ra o [fim]
[mas] vo/cê/ bem/ que [sa]be/ que/ sou [Sátiro]
e [sou] a/pe/nas/ [so]nho /sem/ ce[tim]
pois [eu] que/ tan/to/ [cu]ro tam/bém [firo.]

nos [mar]co, u/no,/ nos [fa]ço/ por/ com[pleto]
e [ve]jo/ vo/cê es[pe]lho,/ mi/nha i[gual]
com [quem] de o/lhos/ fe[cha]dos/ sem/pre [vou]

fa[ze]mos/ e/sse [par] mais/que/ se[leto]
[nin]fa e/ fau/no/ de/ [to]do carna[val]
é [mi]nha/ por/ in[tei]ro/ tal/ lhe [sou]

terça-feira, 26 de março de 2024

Coroa de Sonetos de Amor IX

linda não fale só faça a promessa
porquê agora será minha cadela
fará cada vontade mais possessa
de tornar puta minha Cinderela

ajoelhe-se, mas sem qualquer pressa
Eu quero que meu falo seja a vela
que concentrará toda a sua reza
enquanto minha mão lhe descabela

não para agora e muito menos pensa
como é que ousa servir-me só metade?
abra a boca pra benção do seu fim.

sim, Eu lhe invado e nem peço licença.
Seu sonho satisfaz sua vaidade?
não! não diga mais nada só o seu sim!

segunda-feira, 25 de março de 2024

Coroa de Sonetos de Amor VIII

que me aquece e me faz até esquecer?
é memória de quando era criança
e nós dois inventamos de correr
até depois da igreja pela praça

Eu cai e não parava de doer
como Doía! Ficou essa lembrança
de você branca quando foi me ver
todo sujo no chão uma lambança!

chegou me dando beijos pra sarar
me prometendo já que ia passar
toda dor com carinhos na cabeça

pois veio essa saudade de lhe amar
será que nós daríamos um par?
linda não fale só faça a promessa

que [me a]que/ce e/ me [faz] a/té es/que[cer]?
[é] me/mó/ria/ de [quan]do e/ra/ cri[ança]
e [nós] dois/ in/ven[ta]mos/ de/ co[rrer]
a[té] de/pois/ da i[gre]ja/ pe/la [praça]

[Eu] ca/i e/ não/ pa[ra]va/ de/ do[er]
[co]mo/ Do/ía!/ Fi[cou] e/ssa/ lem[brança]
[de] vo/cê/ bran/ca [quan]do/ foi/ me [ver]
[to]do /su/jo/ no [chão] u/ma/ lam[bança!]

che[gou] me/ dan/do [bei]jos/ pra/ sa[rar]
[me] pro/me/ten/do [já] que i/a /pa[ssar]
[to]da/ dor/ com/ ca[ri]nhos/ na/ ca[beça]

pois/ [vei]o e/ssa/ sau[da]de/ de/ lhe a[mar]
se[rá] que/ nós/ da[rí]a/mos/ um/ [par?]
[lin]da/ não/ fa/le/ [só] fa/ça a/ pro[messa]

domingo, 24 de março de 2024

Coroa de Sonetos de Amor VII

quero seu beijo com fogo e fulgor
de você meu amigo mais querido
amante e confidente dessa dor
causada pela vida e seu perigo

Me abraça forte e dá assim seu amor
que apenas desse jeito Eu consigo
voar, passar do Cristo Redentor
pra lhe contar venturas e perigos

E se hoje estamos juntos depois talvez
distância nem importa pro carinho
somos cúmplices mesmo sem nos ver

o meu amigo amante toda vez
com seu riso, seu cheiro faz meu ninho
que me aquece e me faz até esquecer


[que]ro/ seu/ bei/jo/ [com] fo/go e/ ful[gor]
[de] vo/cê/ meu/ a[mi]go/ mais/ que[rido]
a[man]te e/ con/fi[den]te dessa [dor]
cau[sa]da /pe/la [vi]da e/ seu/ pe[rigo]

Me a[bra]ça/ for/te e [dá a]ssim/ seu/ a[mor]
que a[pe]nas/ de/sse [jei]to /Eu/ con[sigo]
vo[ar], pa/ssar/ do [Cris]to/ Re/den[tor]
pra [lhe] con/tar/ ven[tu]ras e pe[rigos]

[E] se ho/je es/ta/mos [jun]tos /de/pois/ tal[vez]
dis[tân]cia/ nem/ im[por]ta/ pro/ ca[ri]nho
[so]mos/ cúm/pli/ces/ [mes]mo/ sem/ nos [ver]

o [meu] a/mi/go a[man]te/ to/da [vez]
com [seu] ri/so,/ seu [chei]ro /faz/ meu [ninho]
que [me a]que/ce e/ me [faz] a/té es/que[cer]

sábado, 23 de março de 2024

Coroa de Sonetos de Amor VI

minha face na sua padecer
o sorriso de nossos tão felizes
dias, não é o que clama meu querer
que fincou em você longas raízes

exatamente opostos no viver
nossas brigas e fodas tem matizes
nosso amor clama a cama pode ver
mesmo sendo um Apolo e outro Isis

Odeio nosso amor que me controla
pouco a pouco consome  algo de mim
Não lhe quero mais, mas vou pra onde for

Corpo: sim! Mente: não! e o peito chora
não, não me abraça quero um basta!, fim...
quero seu beijo com fogo e fulgor 

[mi]nha/ fa/ce/ na [su]a/ pa/de[cer]
[o] so/rri/so/ de [no]ssos/ tão/ fe[lizes]
[di]as,/ não /é o/ que/ [cla]ma/ meu/ que[rer]
[que] fin/cou/ em/ vo[cê] lon/gas/ ra[ízes]

e[xa]ta/men/te o[pos]tos/ no/ vi[ver]
no/ssas/ bri/gas/ e [fo]das/ tem/ ma[tizes]
[no]sso a/mor/ cla/ma a [ca]ma/ po/de [ver]
[mes]mo/ sen/do um/ A[po]/lo e/ ou/tro/ [I]sis

O[dei]o/ no/sso a[mor] que/ me/ con[trola]
[po]uco a pouco con[so]me  al/go/ de [mim]
[Não] lhe/ que/ro/ mais, [mas] vou/ pra on/de [for]

[Cor]po:/ sim!/ Men/te: [não!] e o/ pei/to/ [chora]
não, [não] me a/bra/ça [que]ro um/ bas/ta!,/ fim...
[que]ro/ seu/ bei/jo/ [com] fo/go e/ ful[gor]

sexta-feira, 22 de março de 2024

Coroa de Sonetos de Amor V

eternidades são de um só calor
que marcam, sutilmente, nossa pele
nos lábios, pelos olhos, no sabor
que me prova na força que me fere

Inebria-me todo esse rubor
de quando seu chicote bem adere
na carne num prazer de doce dor
fazendo com que o gozo se rebele

Mas se depois do gozo vem meu pranto
não será de tristeza meu doce amo
mas sim de assim poder sempre viver

Senhor meu, belo, amado, todo encanto
permite até o deleite que mais amo
minha face na sua padecer

e[ter]ni/da/des [são] de um/ só/ ca[lor]
que [marc]am,/ su/til[men]te, no/ssa/ [pele]
nos [lá]bios,/ pe/los [o]lhos,/ no/ sa[bor]
[que] me /pro/va/ na [for]ça/ que/ me [fere]

[I]ne/bri/a/-me [to]do e/sse/ ru[bor]
de[ quan]do/ seu/ chi[co]te/ bem/ a[dere]
na [car]ne /num/ pra[zer] de/ do/ce [dor]
fa[zen]do/ com/ que o [go]zo se/ re[bele]

[Mas] se/ de/pois/ do [go]zo/ vem/ meu [pranto]
[não] se/rá/ de/ tris[te]za/ meu/ do/ce [amo]
mas [sim] de a/ssim/ po[der] sem/pre/ vi[ver]

Se[nhor] meu,/ be/lo, a[ma]do,/ to/do en[canto]
per[mi]te a/té o/ de[lei]te/ que/ mais [amo]
[mi]nha/ fa/ce/ na [su]a/ pa/de[cer] 

terça-feira, 19 de março de 2024

Coroa de Sonetos de Amor IV

o que nunca, jamais vamos perder
são as nossas lembranças que guardamos
dos momentos de doce padecer
entre os lençóis que juntos nos amamos

lembre também que já fomos foder
pra isso nossos pais nós enganamos
dois jovens toda tarde pra meter
e mentir por dizer: sim, estudamos

"Menina tão ciosa" o pai dizia
e nós dois explorando a anatomia
de nossos corpos: puro despudor!

latim, derivações das matemáticas
entalpia na física, gramáticas 
eternidades são de um só calor

o [que] nun/ca,/ ja[mais] va/mos/ per[der]
[são] as/ no/ssas/ lem[bran]ças/ que/ guar[damos]
[dos] mo/men/tos/ de [do]ce/ pa/de[cer]
[en]tre os/ len/çóis/ que/ jun/tos/ nos/ a[ma]mos

[lem]bre/ tam/bém/ que [já] fo/mos fo[der]
pra [i]sso/ no/ssos [pais] nós/ en/ga[namos]
dois [jo]vens/ to/da [tar]de /pra/ me[ter]
[e] men/tir/ por/ di[zer]: sim,/ es/tu[damos]

"Me[ni]na tão ci[o]sa" o/ pai/ di[zia]
e [nós] dois/ ex/plo[ran]do /a a/na/to[mia]
de [no]ssos/ cor/pos: [pu]ro/ des/pu[dor!]

la[tim], de/ri/va[ções] das/ ma/te[máticas]
[en]tal/pi/a/ na [fí]si/ca,/ gra[máticas] 
e[ter]ni/da/des [são] de um/ só/ ca[lor]
 

quarta-feira, 6 de março de 2024

Coroa de Sonetos de Amor III

nesses sonhos que são da nossa cor
eu branquelo você essa preta linda
seu beijo caramelo o meu quitanda
você alvorada, eu só sol-se-pôr

na minha a sua boca é bem vinda
sua suavidade meu vigor
na sede suculenta meu fulgor
é suor e saliva que nos brinda 

rasteja seus cabelos em meu peito
tal cobras que deslizam pela presa
e dão seu rastro pra me enlouquecer

num mapa de serpente e fortaleza
nós navegamos juntos num só leito
o que nunca, jamais vamos perder

[ne]sses/ so/nhos/ que [são] da/ no/ssa [cor]
[eu] bran/que/lo/ vo[cê e]ssa/ pre/ta [linda]
seu [bei]jo/ ca/ra[me]lo o/ meu/ qui[tanda]
vo[cê al]vo/ra/da, [eu] só/ sol/-se-[pôr]

na [mi]nha a/ su/a [bo]ca/ é/ bem [vin]da
su[a] su/a/vi[da]de meu vi[gor]
na [se]de/ su/cu[len]ta/ meu/ ful[gor]
[é] su/or/ e/ sa[li]va /que /nos [brinda] 

ras[te]ja/ seus/ ca[be]los/ em/ meu/ [peito]
tal [co]bras/ que/ des[li]zam pe/la/ [presa]
e/ [dão] seu/ ras/tro [pra] me enlouque[cer]

num [ma]pa/ de/ ser[pen]te e/ for/ta[leza]
[nós] navegamos [jun]tos/ num/ só [leito]
o [que] nun/ca,/ ja[mais] va/mos/ per[der]

terça-feira, 5 de março de 2024

Coroa de Sonetos de Amor II

sabendo onde estão sem sequer lhes ver
é assim que lido com todos meus medos
e nesse doce ofício de escrever
sem revelar desvelo meus segredos

regojizo do sol em seu nascer
brindo pois me desnudo desde cedo
para o primeiro amor do adolescer
do qual sou eu a casa e o degredo

estamos nós fadados: paraíso
eis o nome da cela de nós dois
cujo caminho descaminha amor

estamos cá sem antes nem depois
eis feito nosso fim o nosso guizo
nesses sonhos que são da nossa cor



sa[ben]do on/de es/tão [sem] se/quer/ lhes [ver]
[é a]ssim/ que/ li/do [com] to/dos/ meus [medos]
e [ne]sse/ do/ce o[fí]cio/ de es/cre[ver]
[sem] re/ve/lar/ des[ve]lo/ meus/ se[gredos]

[re]go/ji/zo/ do [sol] em/ seu/ nas[cer]
[brin]do/ pois/ me/ des[nu]do/ des/de [cedo]
[pa]ra o/ pri/mei/ro a[mor] do a/do/les[cer]
do [qual] sou/ eu/ a [ca]sa/ e o/ de[gredo]

es[ta]mos/ nós/ fa[da]dos:/ pa/ra[íso]
[eis] o/ no/me/ da [ce]la/ de/ nós/ [dois]
[cu]jo/ ca/mi/nho [des]ca/mi/nha a[mor]

es[ta]mos/ cá/ sem [an]tes/ nem/ de[pois]
[eis] fei/to/ no/sso [fim] o/ no/sso [guizo]
[ne]sses/ so/nhos/ que [são] da/ no/ssa [cor]

segunda-feira, 4 de março de 2024

Coroa de Sonetos de Amor I

Moça bonita me faz seu amor
com seu beijo todinho para mim
mas não fique vermelha de pudor
pois daí minha fome não tem fim

Quero sua saliva e seu suor
vem na língua, na boca bem assim
sabe como ficar mais que melhor?
se me amar também cada pedacim!

Eu quero é suas mãos tão famintas
ávidas, curiosas, atrevidas
me tocando, mostrando seu querer

Beije vai, uma a uma de minhas pintas
de meu corpo, lhes chame de queridas
sabendo onde estão sem sequer lhes ver


[Mo]ça/ bo/ni/ta [me] faz/ seu/ a[mor]
[com] seu/ bei/jo/ to[di]nho/ pa/ra/ [mim]
mas [não] fi/que/ ver[me]lha/ de/ pu[dor]
[pois] da/í/ mi/nha [fo]me/ não/ tem [fim]

[Que]ro su/a sa[li]va e/ seu/ su[or]
[vem] na/ lín/gua,/ na [bo]ca /bem/ a[ssim]
[sa]be/ co/mo/ fi[car] mais/ que/ me[lhor]?
[se] me a/mar/ também [ca]da peda[cim!]

[Eu] que/ro/ é/ su/as/ mãos/ tão/ fa[mintas]
[á]vi/das,/ cur/i[o]sas,/ a/tre[vidas]
[me] to/can/do,/ mos[tran]do/ seu/ que[rer]

[Bei]je/ vai/, u/ma a/[u]ma/ de/ mi/nhas/ [pintas]
[de] meu/ cor/po,/ lhes [cha]me/ de/ que[ridas]
sa[ben]do on/de es/tão [sem] se/quer/ lhes [ver]

segunda-feira, 26 de fevereiro de 2024

Hai-quase 26/02



Segunda de sol

sem nuvens, garganta seca

vai uma cerveja?

segunda-feira, 19 de fevereiro de 2024

Reflexões Privadas

 ANÚBIS É 
UM DEUS 
QUE LADRA

quarta-feira, 24 de janeiro de 2024

ré médio

Você é o meu remédio
é a cura do meu tédio
meu gesso de pé quebrado 
o meu soneto emendado

Eu fiz pra você amor
a cantiga mais bonita
a música tema 
da nossa vida

Sou sim desse jeito
sou seu par perfeito
batom bem vermelho
que mancha e lhe chama
de pé e de joelho
que é assim que se ama

Eu fiz pra você amor
a cantiga mais bonita
a música tema 
da nossa vida

Sol de prometeu
todo todo meu
vem, queima comigo 
me põe a perigo
e me faz de mim
a sua mulher

Eu fiz pra você amor
a cantiga mais bonita
a música tema 
da nossa vida

Me olho no espelho 
faminta de briga
confesso o conselho
da minha barriga
capricha no estilo
vem nosso filho

Eu fiz pra você amor
a cantiga mais bonita
a música tema 
da nossa vida

Escuto ajeito escrevo
gravo antes de dormir
boto na rádio e me atrevo
só pra você me ouvir