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Poeta e apenas poeta

Já me olharam espantados quando digo que sou poeta e só poeta. Que não canto, nem danço, nem atuo, nem pinto, nem bordo, que "só" ...

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terça-feira, 17 de julho de 2012

Procura-se Revisor de Livreto Caseiro de Poesia

Outro dia no vagão do trem um singelo senhor de seus 40 e tantos anos, de óculos e barba. Um tipo daqueles com ares de intelectualidade e sapiência. Veio me dizer que não levaria meu livreto porque havia nele terríveis erros gramaticais que não seriam desculpáveis nem sob a luz da métrica, estilística ou licença poética.


Obviamente desconcertado e envergonhado admiti a culpa e perguntei solícito se ele poderia me apontar os erros. A resposta veio seca: sou revisor, para esse serviço só pagando. E eu fiquei olhando para a cara dele meio embasbacado sem ter uma reação prevista ou em pensamento.


Mais tarde revisei o livreto com olhar crítico poema a poema, verso a verso. Não encontrei nada que não se justificasse por uma rima, por um metro mais teimoso. Todo esse rigor do revisor só pode ser para justificar o seu ganha pão, será que ele achou assim tão absurdo alguém viver de poesia? Ou será mesmo que ele acha que eu poderia querer contratá-lo para revisar meus livretos?


Ele ainda se safou dizendo que só criticou pois viu que tinha ali algum valor, leu tudo, do primeiro ao último poema, mas será que foi só sadismo para me desconcertar ali ou será que não entendia tão bem assim de versificação mas somente de gramática pura?


Bom, pelo sim pelo não... Fica ai aberta a vaga de revisor de livreto de poesia do poeta sobre trilhos! Não quero mais passar vexame dentro dos vagões.

sexta-feira, 13 de julho de 2012

Passado, Presente e Perigo nos Trilhos.

Viver da poesia sobre os trilhos do trem me faz sentir como se eu voltasse no tempo, e refizesse os caminhos de meu próprio avô, pois ele durante as décadas de 40,50 e meados de 60 viveu e criou sua família como comerciante da Estrada de ferro Bahia Minas que partia de Arassuai (sim naquela época Arauçuai tinha até outra grafia!) e ia até Ponta de Areia na Bahia.


O Natalino pai, nascido em 25 de dezembro, alugava um vagão do trem que ficava estacionado próximo de sua venda em Alfredo graça que era a primeira parada após o trem partir de Arassuai. O Natalino Filho (meu pai que não era nascido no natal mas ganhou o nome por capricho de meu avô) me conta que ele com seus 7 anos brincava no armazém onde havia montanhas de grãos de feijão e de milho.


Meu avô carregava o vagão com milho, melancia, feijão, farinha de mandioca e demais produtos produzidos na região. No percurso do trem ia aos poucos esvaziando o vagão e enchendo-o novamente com tecidos, perfumes, ferramentas e outros tantos produtos que chegavam ao porto.


Mas isso mudou pois no ano seguinte ao golpe de 64 os militares assinaram um decreto desativando a Estrada de Ferro, sem a estrada não havia mais como escoar a produção da região e meu pai pegou em 66 o último trem para Araçuai onde minha avó se tornou gerente dos correios e meu avô fazendeiro.


Essas divagações me vieram quando vejo a insensibilidade do metrô que não se importa com a natureza do que se trata o livreto com o qual estou despertando os leitores. Eu acabo vendendo muito no metrô mas ali a venda de poesia não é uma atividade muito bem quista pelos seguranças.


Quando entro em um vagão tenho que tomar cuidado para ver se não tem um segurança a bordo, eles sempre me chateiam. Era o segundo vagão da noite, entrei e caminhei até o fundo dele quando reparei quase imperceptível um segurança, ele me notou. Esperei sentado no percurso até a próxima estação e quando fui trocar para o vagão de trás o nosso amigo veio me seguir. Aquela situação estava chata e eu tive que pensar rápido. Quando o apito do metrô soou para as portas se fecharem eu saltei do vagão. E a porta se fechou atrás de mim sem que desse tempo dele continuar atrás. A verdade é que me senti meio que num filme de ação e tive que resisitir a virar e dar tchauzinho para o homem de preto. Sentei na estação, tirei os óculos, vesti o agasalho longe das cameras de segurança e fiquei jogando no celular até o próximo metrô passar.


Ser poeta sobre trilhos, talvez o único poeta underground (literal) do rio, é um enorme prazer. Ver o sorriso no rosto alheio, os olhares encantados, a felicidade estampada vale os riscos. Ninguém pode me tirar esse prazer, principalmente quando sei que são milhões de leitores adormecidos que passam por ali todo dia, aos poucos eu vou conseguindo levar até eles. Oito mil livretos vendidos nesse processo que já dura seis meses. Mas a pergunta que me move é: você tem ideia do que pode uma mente que voltou a usar a sua imaginação?

terça-feira, 10 de julho de 2012

Poeta e apenas poeta

Já me olharam espantados quando digo que sou poeta e só poeta. Que não canto, nem danço, nem atuo, nem pinto, nem bordo, que "só" faço versos e de quado em vez me arrisco na prosa.


Em tempos tão performáticos e midiáticos há espaço para um poeta que seja apenas poeta? Há espaço para quem apenas aprecia a arte da escrita, que gosta de observar a leitura silenciosa de seus versos? Que gosta do efeito de um poema que ao terminar de ser lido seja relido e lido novamente?


Eu, sinceramente achava que não, acreditava que jamais faria sucesso como poeta por não saber e nem querer, cantar, recitar, declamar ou mesmo sapatear com meus versos. Tá, eu confesso, era uma mistura de timidez com falta de jeito para as demais artes. Porém o que é dificuldade e barreira também é o estimulo para a invenção.


O Poeta sobre Trilhos surge como um personagem capaz de levar a poesia para um público amplo sem depender do suporte de outras artes como a retórica, a música ou as artes cênicas. A poesia, somente a poesia em papel e tinta se basta na tarefa de levar o prazer de si mesma para os leitores.


Nada de declamação, nada de piruetas ou acordes de violão. Dentro de cada vagão levo apenas meus livretos de poemas. Oito páginas com minha poesia bem diagramada e com letras grandes para que todos possam ler, mesmo aqueles que já estão com os braços curtos e esqueceram os óculos em casa.


Sei que é lindo ter uma platéia cantando junto suas músicas ou gargalhando em sincronia com sua atuação. Mas sou eu muito feliz de poder ver a sinfonia silenciosa das expressões de meus leitores dentro dos vagões.

sexta-feira, 6 de julho de 2012

Poeta Sobre Trilhos em: Poesia sabor canela!

Um chiclet de canela por um livreto de poesia me parece uma troca surreal. Mas muitos dizem que é surreal viver de poesia hoje em dia. E é isso que eu venho fazendo há um ano e meio na cidade do Rio de Janeiro.


Como assim um chiclet de canela por um livreto de poesia? Me perguntam embasbacados. Talvez por não saberem o que eu faço do meu dia a dia isso torna-se mais impossível. Porém eu reconto, eu vendo poesia dentro dos vagões do metrô e do trem da capital fluminense (aprendi a pouco tempo que carioca é só quem nasce na cidade e o natural do estado é o fluminense!).


Distribuo dentro de cada vagão cerca de 30 livretos e espero a reação dos leitores. É sempre fascinante ver como cada pessoa reage ao ler poesia depois de muito tempo e até mesmo pela primeira vez. Tem quem folheie desinteressado e depois largue pra lá, quem devore tudo com avidez e vontade, quem lê esquece do mundo ao redor, enfim gente de todo tipo com reações de todo tipo!


Mas voltando ao chiclet de canela, tinha uma linda menina de cabelos loiros lisos, aparelho nos dentes e não mais de treze anos que estava com a mãe dentro de um vagão. Ela lia com muita avidez que eu pensei até que ela nem se lembraria de me pagar ou devolver o livreto.


Eu estava enganado porém antes de ir abordá-la recolhi e vendi os livretos que restavam no vagão e fui lá preparado para pedir de volta o livreto. Minha surpresa foi quando ela me disse que não tinha dinheiro pois gastara complando um pacote de trident de canela. Olhou pro trident e me perguntou se eu aceitava o chiclet em troca do livreto.


Eu só ri surpreendido e feliz. O escambo é algo maravilhoso, a troca de um objeto por outro é melhor e mais mágico que a troca por dinheiro. Ela trocou algo que dava prazer a ela por algo que estava lhe dando, talvez, ainda mais prazer! Não estava trocando um prazer de fato pelo prazer potencial do dinheiro, era algo tangível e completo.


Eu assim nunca fui o maior fã de chiclet de canela mas desse dia em diante ele me surgiu como um sabor fantástico, um sabor de lembrança e de sonho. O de saber que uma doce menina no auge dos seus treze anos se encantou por meus versos.


E como eu sempre digo, minha vida não dá um livro porque é inverossímil demais. Estou escrevendo esse relato que procrastino há duas semanas justamente porque voltei a encontrá-la. Saindo da estação Afonso Pena lá estava ela, sorrindo pra mim e perguntando se tinha poesia. Eu não reconheci na hora, mas quando ela sacou o envelope de chicletes...

quarta-feira, 6 de junho de 2012

O Homem de Preto disse sim pra poesia

As coisas estão mudando ou estou tendo mais sorte que o costume. Um homem de preto leu meu poema em voz alta no vagão! Sim, parece surreal depois de tantas desventuras e problemas mas aconteceu.


Foi mais ou menos assim, estava eu lá na estação de Gal. Osório, parada final, distribuindo meus livretos quando entraram dois funcionários do metrô que pelo uniforme eu sabia que se tratavam de caixas e por isso nunca se incomodavam em ler meus versos, muito antes pelo contrário.


Entreguei meus livretos para ambos e terminei de preencher o vagão com poesia e me sentei foi quando ele, o homem de preto, entrou e na hora eu praguejei pois perderia todos aqueles livretos por causa da encrenca. Sem muita surpresa ele foi conversar com os dois outros funcionários, com apreensão eu o vi pegando o livreto e com absoluta surpresa o vi lendo e ainda por cima lendo em voz alta.


Vendo aquilo fiquei totalmente sem reação, meio ainda sem entender fui desconfiadamente recolhendo os livretos. Eu conversei com um casal universitário que adorou o projeto despertando leitores e lá eu me demorei na conversa para me acalmar um pouco.


De uma ponta a outra recolhi vagarosamente de cada um dos presentes até chegar naquele confronto inevitável que para não abusar da sorte eu esperei chegar na estação de Botafogo para na troca de vagão simplesmente anunciar aos dois caixas que os livretos eram presentes.


Pude ver que o segurança riu de meu medo e desconfiança, mas gato escaldado tem medo de água fria. Depois de tantas desventuras com os homens de preto já tava de bom tamanho que meus versos foram bem aceitos e degustados com prazer.

sábado, 21 de abril de 2012

O Pivete e o Homem, exercícios do papel de macho.

Caminhávamos ali pela mem de sá antes de chegar aos arcos da lapa quando chegou um menino de pequeno de menos de 12 anos e olhou no fundo dos olhos dela e puxou sua correntinha de ouro do pescoço e saiu correndo.


Eu não pensei duas vezes e corri atrás do moleque, ele tentou se enfiar no meio da multidão mas antes disso eu o peguei e ele caiu no chão. Gritei com ele perguntando cadê a corrente até que ele desesperado, sim o olhar dele tinha muito medo, me falou que tava no chão e apontou.


Ainda fora de mim levantei ele do chão com um movimento só e as pessoas ao redor já se agitavam querendo que eu chamasse a polícia. Nesse momento eu só via o olhar de pânico do garoto e soltei ele. Quando falaram em polícia eu fiquei morrendo de medo do que eles poderiam fazer com aquele menino.


Deixei aquele lugar meio atabalhoado, uma moça até chegou próximo da gente perguntando se a gente não ia mesmo chamar a polícia e um cara veio mostrando uma outra correntinha perguntando se também era nossa. Negando a ambos atravessamos os arcos da lapa finalmente. As ruas estavam cheias de gente mas eu não via ninguém. Minha cabeça estava um caos, fervilhando de pensamentos e meu peito de sentimentos contraditórios.


Depois que a adrenalina se diluiu em meio ao meu sangue me senti duplamente mal por tudo isso. Primeiro por ter causado todo esse horror no moleque que é uma criança e depois por ter obedecido a todo o adestramento social que faz do homem esse animal, o sexo masculino é ensinado, desde criança, a ser uma espécie de cão de guarda.


Fiquei imaginando as merdas que aqueles policiais poderiam fazer com aquele menino que sequer tem idade para ter discernimento de algo. E também imaginando o que eu poderia ter feito se não tivesse visto aqueles olhos dele em pânico. O pior é que por mais bestial que tivesse sido meu ato, ele seria apoiado por todos ao redor, teriam visto e dito que o "ladrãozinho" mereceu. Como é que uma criança dessas poderia ter merecido algo assim? Só aqueles olhos, só aquele medo que dava para sentir o cheiro já foi muito além da conta que ele merecia.


Dentro da van indo para casa tive ódio de mim mesmo, por ter feito exatamente como fui adestrado pela sociedade a fazer. A proteger meu território, a responder imediata e com violência ao ato. Não pensei, só agi como fui condicionado a agir. Nós homens somos criados para agir com essa violência desmedida desde o início, em jogos competitivos, em brincadeiras com espadas.


Essa "educação" fez acontecer esssa pequena corrida ao pivete mas também faz acontecer todos os dias os socos no olho porque o cara mexeu com sua mulher, as facadas no ventre por que o cara lhe olhou torto e muitos e muitos óbitos que só acontecem porque nossa sociedade adestra os homens para serem cães de guarda prontos e preparados para atacar ao menor sinal de ameaça ao seu território.


Ela ficou feliz por ter de volta a corrente que tinha um pingente de sua avó, me agradeceu por isso. Me fez algum elogio pela minha "coragem". Sim, como bom macho alfa eu mostrei minha força para defender a fêmea que estava comigo. Que revolução sexual, que igualdade de gêneros há nisso? Até quando vamos criar nossos filhos nesses dois papéis rigidos e opressores? Isso tudo me fez chorar dentro daquela van, já sem adrenalina, pois ao invés de ficar mais calmo todos esses pensamentos me deixaram ainda mais atordoado.


A violência fisica é uma escola que botamos nossos filhos machos desde seus primeiros anos de vida. Foi por essa escola que era eu homem correndo atrás de um aprendiz de homem.  É a mesma escola que o empurrou para cometer esses delitos e também leva sua irmã a se prostituir. Foi por essa escola que 70% das mortes violentas são de homens. É nessa escola de violência que se baseia nossa sociedade que ainda oprime as mulheres e massacra os homens.


Aquela correntinha arrancada, com o pingente da avó. Me fez ver como ainda sou de certo modo um cão de guarda protegendo a coleira. Defendendo com unhas e dentes uma sociedade opressora, uma animalização do homem terrivelmente intensa. Um cão de guarda e só.

sexta-feira, 2 de setembro de 2011

Quotidiano sobre trilhos

Praticamente todo dia quando saio da UFRJ  eu pego o ônibus de integração para a estação de Del Castillo. Nessa quinta feira ainda não é dia de pagamento então está todo mundo meio duro. Sinal que recebo mais moedas do que notas. O que me leva a uma situação chata, pois como não sou lá um grande economista, costumo sempre depositar as notas e usar as moedas para minhas despesas do dia a dia, cerveja, comida, ônbus e por ai vai.

Fim de mês, mochila cheia de moedas e eu mudo de vagão para continuar despertando os leitores do seu sono literário. Sim, é assim que eu enxergo o que faço, sou despertador ambulante, um guerrilheiro da poesia. Assalto poeticamente as vítimas em seu momento mais vulnerável: quando estão completamente entediadas, naquela espera até a estação de desembarque. Afinal são muitos os que ficam olhando pro tempo, que jogam um joguinho estúpido no celular, fazem as unhas ou qualquer outra coisa sintomática do tédio absoluto.

Enquanto são absorvidas por um tédio (que só não é maior que ver faustão no domingo na casa da avó) eu levo meu livreto de poemas até elas, algumas se atiçam pela curiosidade quando falo que estou vendendo aquele pedaço de papel, outras abrem o livreto no meio (sim a maioria abre exatamente no meio do livreto) e encontram um poema erótico-engraçadinho, tem também aquelas que quando eu falo a palavra mágica: "poesia" se eriçam na hora. O negócio é que em dois ou três minutos eu coloco um vagão inteiro para ler poesia.

Sim, umas trinta a quarenta pessoas com livreto na mão e lendo poesia. Umas param na primeira e voltam pro universo do tédio, outras já querem comprar! São aquelas que realmente acreditam na poesia e no poder encantatório das palavras. Tem quem leia até o final devorando absortas e nem percebem quando passo recolhendo os livretos, essas se não prestarem atenção que eu estou recolhendo me deixam com o ego tão envaidecido que acabam ganhando o livreto, pois começo achar que seria um crime estragar aquela leitura tão ávida. Tem quem devolva o livreto sem nem abrir e também quem me deseje sorte para lançar meu livro, mal sabendo que com os livretos eu chego a um público que eu nunca conseguiria chegar com o livro, mas eu sorrio e agradeço aos votos.

Mas meu dia é ganho mesmo quando acontecem aqueles eventos únicos como a senhora negra de cabelos brancos que se levanta e começa a recitar um poema meu para suas companhias, sim e é aquele poema erótico-engracadinho! Ela recita em plenos pulmões e fica me elogiando à beça. Eu, claro, fico vermelho de vergonha mas se colocarem uma agulha perto do meu ego ele explode de tão inflado! A senhora então desmancha elogios, diz de como é bom que alguém faça isso no metrô, que leve  poesia e arte para as pessoas. A cada elogio ela me encabula mais e mais. Nesse momento eu dou corda, conto para ela do meu sonho que é ter mais e mais gente lendo poesia. Nesse vagão praticamente ninguém me devolve os livretos e melhor, são poucas as moedas e muitas as notas.

Tem quem diga que eu deveria fazer isso na lapa, na frente do CCBB, da biblioteca nacional e outros grandes lugares onde a turma cultural está reunida. Eu conto o caso que aconteceu comigo no trem, bom, no trem se compra e vende de tudo e lá eu aprendi que todo mundo pode se abrir a uma experiência nova se lhe for oferecida. Quando vendo poesia eu nunca seleciono público, seleciono quem vai ler e quem não vai. Nisso os ambulantes que estão ali também recebem livretos, e leem e se divertem com meu trabalho. Mas o melhor dia foi quando eu escutei: "Ei, Lucas, tem poesia nova ai?" e quem me perguntou isso foi o vendedor de coca, cerveja e água. Sim, de bermuda e havaianas e camisa do flamengo  ele me veio pedir por mais poesia! O esteriótipo perfeito que muitos dos cultos diriam que jamais iriam gostar de poesia. Mas estava ali me perguntando se eu tinha mais. Ao entregar o livreto ele me fez a pergunta de sempre: "quanto custa?" e eu como sempre com um sorriso desafiador respondi: "Você é quem me diz quanto vale" a resposta me surpreendeu: "pode ser uma coca?". Confesso que eu nunca bebi uma coca cola com tanto prazer.

Tem mais outros tantos casos, estórias engraçadas e divertidas mas agora vou voltar pra minha quinta feira e contar uma das travessuras que aprontei no metrô. Sim, eu acabo vendendo muito no metrô mas ali a venda de poesia não é uma atividade muito bem quista pelos seguranças. Quando entro em um vagão tenho que tomar cuidado para ver se não tem um segurança a bordo, eles sempre me chateiam.  Era o segundo vagão da noite, entrei e caminhei até o fundo dele quando reparei quase imperceptível um segurança, ele me notou.  Esperei sentado no percurso até a próxima estação e quando fui trocar para o vagão de trás o nosso amigo veio me seguir. Aquela situação estava chata e eu tive que pensar rápido. Quando o apito do metrô soou para as portas se fecharem eu saltei do vagão. E a porta se fechou atrás de mim sem que desse tempo dele continuar atrás. A verdade é que me senti meio que num filme de ação e tive que resisitir a virar e dar tchauzinho para o homem de preto. Sentei na estação, tirei os óculos, vesti o agasalho longe das cameras de segurança e fiquei jogando no celular até o próximo metrô passar.

Ser poeta sobre trilhos, talvez o único poeta underground (literal) do rio, é um enorme prazer. Ver o sorriso no rosto alheio, os olhares encantados, a felicidade estampada vale os riscos. Ninguém pode me tirar esse prazer, principalmente quando sei que são milhões de leitores adormecidos que passam por ali todo dia, aos poucos eu vou conseguindo levar até eles. Oito mil livretos vendidos nesse processo que já dura seis meses. Mas a pergunta que me move é: você tem ideia do que pode uma mente que voltou a usar a sua imaginação?

domingo, 22 de maio de 2011

O Salvamento da Gatinha

Quinta eu banquei o herói de uma gatinha que miava no alto da grade do Campo de Santana quase em frente ao prédio do corpo de bombeiros que me lembra um palácio russo por sua imponência vermelha. Eu olhei para ela e disse: "Senhorita, vamos negociar isso. Eu lhe salvo mas você não me arranha viu?"

A salvei do alto da grade e a coloquei no chão. Segui sozinho e fui surpreendido pelos miados que me seguiam! Sim, a gatinha tinha se apaixonado, tentei ir mais rápido Mas ela me acompanhava! Foi me seguindo por toda a extensiva praça até que eu parei para ver qual era a delá e ela foi logo se enroscando nas minhas pernas.  

Confesso que se eu já estivesse morando em Sao Cristóvão ela tinha ganho um novo lar.  Peguei o ônibus para Caxias com muito pesar de deixar a gatinha pra trás. Acabei descendo no ponto errado porque estava pensando na gata e deixei passar a praça onde eu deveria descer.

No caminho  de volta para casa passei por três gatos sentados me observando. Muito estranho! Senti como se eles estivessem vigiando o meu caminho em retribuição à minha boa ação do dia.


Até tirei fotos de dois deles, o primeiro ficou pra trás porque a rua era muito muito deserta e eu não iria tirar a câmera no meio da rua e correr riscos. Segue a baixo as fotos do que estava na praça e do que estava dentro da estação de trem. Engraçado como eles estavam me encarando conforme eu caminhava.





quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

No ponto de ônibus

No ponto de ônibus vira-se e pergunta para mim com aqueles olhos castanhos:
- Porquê?

Pego completamente surpreso respondo de pronto:
- O quê?

E não contendo o riso ambos se entreolham e eu
digo:
- Porquê?

Mais que depressa ela responde:
- O quê?

Há mais gente conosco naquele ponto, pessoas transitando esperando sua condução para a cama, afinal, era dia de semana e já estava de noite.

Para nós a noite só estava começando e numa troca infinita de porquês e oquês todos ao redor do ponto simplesmente se afastam.

Isso quase nos assusta e intimida, mas no fundo o gosto do proibido, do desafio, do surreal e do divertido nos convence a continuar:
-Porquê?
-o quê?
-O quê?
-Porquê?

O onibus amarelo finalmente chega e esquecemos disso no processo de pegar passagem, procurar lugar, se sentar e tudo mais. Mas bastou sentarmos para que ela virasse para mim em tom de desafio e perguntasse novamente:
-Porquê?

quarta-feira, 20 de janeiro de 2010

Terezinha Vaz Lisboa

Lucas C. Lisboa

Esse é um pedaço da história da minha avó, contada por ela, recontada por meus tios e uma parte realmente vivenciada por mim, conto com emoção e sem muita preocupação com nada mais que relatar o que senti e vivi nos quase vinte anos que essa história de desenrolou.

A barragem do Setúbal começou a ser construida no fim da década de oitenta mas foi paralizada quando saiu o Governador Newton cardoso e entrou o Hélio Garcia. Havia denúncias de superfaturamento, problemas com a pastoral da terra e com os desalojados pela barragem. Com isso o novo governador mandou desmanchar as fundações que já tinham sido construidas.

A despeito de todas essas justicativas o rio setúbal ia secar em pouco tempo sem a barragem mas os políticos da região não queriam ir contra o governo do estado.

Minha avó Dona Terezinha só com ajuda das pessoas da vila de Jenipapo conseguiu impedir que tal desastre acontecesse!Ela com mais de sessenta anos na época cavou uma vala para não deixar as máquinas irem destruir a barragem e também invadiu a mesma.

Quando ela invadiu a barragem os prefeitos da região reuniram mais 70 policiais para cercar a obra e intimidar a população de lá (é interessante lembrar que cada cidade da região nao tem mais que 4, 5 policiais)

Depois de invadida a obra houve ações na justiça contra a CEMIG que por sua vez também entreou com uma ação de reintegração de posse. Depois da invasão D. Terezinha fez piquete em frente ao prédio da cemig, juntou dinheiro com os moradores da Cidade e apenas um comerciante e a dona da pensão D Lucia ajudaram durante o processo todo o resto foi junto com agricultores, moradores, nenhum vereador ou político que seja ajudou.

Eu me lembro que com meus cinco anos eu estava pintando as faixas na casa de meu avô em Belo Horizonte para fazer a manifestação. Ficamos até de madrugada terminando as faixas, quando fomos embora da casa dela o pneu do carro do meu pai furou e ao ir trocá-lo ele foi atropelado. No dia seguinte Eu e ele assistimos a manifestação da janela do Hospital Mater Dei que é em frente ao prédio da CEMIG.

Com as máquinas paradas até 1992 saiu liminar juiz para que os manifestantes saissem de lá. Na ocasião minha avó teve uma arma apontada ao peito pelo advogado da CEMIG e foi mandada sair de lá e, ao invés de se intimidar, ela caminhou para frente e dizendo atira porque eu não saio!

No fim do processo os animos foram acalmados e por causa da chegada das chuvas não havia mais tempo para desmanchar a barragem e a CEMIG se viu obrigada a fazer uma obra de contenção para manter a barragem como estava.

A barragem foi salva da destruição imediata mas foi esquecida pelas autoridades, pela CEMIG e tudo mais. Durante toda a década de 90 eu vi minha avó procurando políticos, autoridades, prefeitos, governadores, diretores da CEMIG e recebendo apenas promessas.

Já na década seguinte eu comecei a ajudá-la junto com meu pai, escrevendo os ofícios e acompanhando ela por muitas e muitas reuniões. Finalmente conseguimos que a CEMIG declarasse seu desinteresse pela obra e transferisse seus direitos sobre ela para a RURALMiNAS.

Com isso começou outra fase onde minha vó mandava cartas e mais cartas em busca de recursos para a construção da obra e em 2004 estavamos lá presentes, no Palácio da Liberdade, na assinatura do convênio entre o Governo Estadual e o Federal para a finalização da obra.

Só que em tudo isso nunca houve nenhum reconhecimento sobre o trabalho da minha avó. Cada político da região tentou fazer de si o pai da obra, como se tivesse feito algo por ela! Tanto fizeram que só os moradores antigos realmente se lembravam do que minha vó fez e até riam quando diziamos da nossa história.

Bom, pelo menos era assim até o dia de ontem! Na última quinta feira descobrimos que Lula ia vir para a inauguração da barragem e tinhamos certeza que se não fizessemos nada ninguém ia se lembrar de toda a história de todo o esforço dela.

Nós, eu e meus tios, já tinhamos mandando inúmeras cartas ao presidente mas agora era diferente, ele estaria ali para inaugurar a obra! Minha tia, morando nos EUA passou os dias ligando e mandando e-mails para a assessoria de imprensa e cerimonial do governo mas não conseguimos saber de forma alguma se ia de fato chegar aos ouvidos dele.

Estávamos sem esperança a respeito de tudo, porem, sabiamos que aquela obra era a realização dela e ela deveria estar presente mesmo que se ninguém tocasse no nome dela, estariamos ali para comemorar.

Só que foi muito melhor do que todos nós poderíamos imaginar, ao subir no palco, Lula seguiu com os agradecimentos habituais até que começou a ler, linha a linha, a carta que finalmente chegou a ele! Eu não contive as lágrimas ao ver ao vivo o video abaixo:


sexta-feira, 28 de agosto de 2009

Eu odeio loja de roupa

Lucas C. Lisboa

Quando tinha por volta dos meus dez anos , já morava aqui no Santo Agostinho e minha mãe me levava para brincar no campo do atlético pois era aberto ao público e ao lado da minha casa. Porém , numa determinada manhã que íamos para lá qualan não foi nossa surpresa ao descobrirmos que o campo tinha sido vendido e que lá iria seriA construido um shopping? Sim, lá seria construído o Diamod Mall.

Nos tempos que se passaram eu realmente fiquei empolgado com essa história, afinal num shopping teria fliperama, cinema, Mac Donalds, fliperama e quem sabe até uns circos e parques que nem tinha no Del Rey, Minas e no BH! Dois anos depois de fechado e muito barulho na vizinhança não é que o Diamond fica pronto , mas para minha profunda decepção não é um shopping só de roupas? Sim! milhares de lojas vendendo roupas que não eram de meu interesse, roupas chiques, feias, para adultos! Nada de Fliperamas, só o Hotzone caro para caralho! E muita, muita loja de roupa! E nisso começou a nascer minha antipatia pela lojas de roupa.

O Diamond virou assim um shopping que eu ia só para tirar dinheiro e almoçar no domingo quando não tinha nada de comer lá em casa. Passou um tempo e ,não contentes em ter um shopping só para elas as lojas de roupas ,começaram a comprar e reformar as casas ao redor do Diamond, uma loja de noivas ali, uma outra de vestidos de festas por aqui e foi assim até que compraram o Amarelinho!

Meu bar/restaurante favorito que ficava numa esquina A só um quarteirão da minha casa e servia até bem tarde e tinha garçons amigáveis. Era um dos meus lugares favoritos de passar para tomar uma, sentar com o pessoal e fazer aquela boquinha de madrugada. Mas as lojas de roupa O compraram ele e o transforam, num requinte de crueldade, em um anexo todo fechado da loja de roupa que era ao lado! Aquela esquina de toldo amarelo agora era toda um muro grande e branco, muito sem graça , diga-se de passagem.

Agora, tomando meu bar favorito, eu realmente comecei a não gostar dessas lojas de roupa! Mas meu ódio por elas só se consolidou essa semana. Estou passando uns tempos na casa de meus amigos e lá acabei assumindo o papel de dono-de-casa e como tal fui à feira porque eu adoro pizza, sanduíches e comidas prontas , mas meu estômago reclama depois do terceiro dia vivendo À base delas... A dois quarteirões de lá tinha um açougue e um sacolão a preços não muito bons, porém ,tão perto assim, não havia nada nem sequer parecido. Mas minhas surpresa foi grande demais ao passar pelo sacolão e ao procurar o açougue e descobrir que ele virou sabe o que? Sim! uma maldita loja de roupa!

Como diabos alguém transforma um açougue numa loja de roupa? Isso é muito descabido! Não faz o menor sentido! E são todas aquelas lojas de roupas chiques, sempre vazias , sem ninguém dentro! Algumas até com interfone para se entrar... Toda vez que eu vejo uma dessas não consigo deixar de pensar que se trata de uma loja de esposa entediada e bancada pelo marido para que ela não o perturbe muito. "Vai lá meu bem, toma esse cheque em branco e monta sua loja" não contentes em simplesmente comprar quilos e quilos de sapatos, bolsas e coisa e tal.

Agora essas senhoras estão invadindo Belo Horizonte com suas lojas que só ocupam espaço! Ficam lá dentro aquelas vendedoras arrumadinhas, sorridentes e completamente sem o que fazer , ou porque eu nunca vi uma viva alma dentro delas. Sim, eu tenho raiva, tenho ódio dessas lojas de roupas que me roubaram o campinho de futebol, tomaram o lugar do meu fliperama e agora até mesmo o açougue! Eu odeio loja de roupa.