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Poeta e apenas poeta

Já me olharam espantados quando digo que sou poeta e só poeta. Que não canto, nem danço, nem atuo, nem pinto, nem bordo, que "só" ...

segunda-feira, 22 de abril de 2013

Coroa de Sonetos de Amor - XI

é minha por inteiro tal lhe sou
e desde que meus lábios lhe provou
jamais esqueci dessa tecitura
tão faminta que agora me tortura

a sua pele é de quando deus errou
tecendo-lhe asas de anjo em pleno vôo
zelando por seu corpo com doçura
e me atiçando minha mente impura

Lhe farei dos meus reinos a princesa
terá tudo que sonha apenas peça
meu banquete de farta e bela mesa

e a felicidade mais que uma promessa
ao seu lado é, acredite, certeza
não quero que se assuste nem esqueça

Coroa de Sonetos de Amor - XII

Não quero que se assuste nem esqueça
pois com meus gesto cheios de rudeza
eu quero lhe dizer que minha pressa
é o tanto que minh'alma lhe deseja

Antes que nessa mente os medos teça
sente e beba comigo um vinho à mesa
sinta o sabor do aroma nessa taça
pois cada gota é toda uma represa

Você é meu vinho mais inebriante
sabor macio, toque suave de carvalho
uma delícia de não ter mais fim

Mais uma taça e um brinde de amantes
nesse amor só lhe quero sem atalho
quero que saiba bem, tal é pra mim

Coroa de Sonetos de Amor - XIII

quero que saiba bem, tal é pra mim
só quero lhe comer. Mais? não tô afim
não podemos pular todo esse flerte
e vir logo pagar-me esse boquete?

não, não que eu seja uma pessoa ruim
mas mulher bonita trato assim
se ela não sabe nem pintar o sete
e na cama só paga de vedete

você se faz de burra como uma porta
e espera que eu me dê todo o trabalho
de desvendar o que já não mostrou?

Não se faça de tonta esteve torta
desde o começo fora do baralho
moça bonita, nunca alguém lhe amou....

Coroa de Sonetos de Amor - XIV

Moça bonita nunca alguém lhe amou
do tamanho do espaço sideral
Mas digo bem sincero que beijou
meus lábios despertou um sem igual

Moça bonita veja bem como sou
as minhas asas são do carnaval
passado e minha auréola vazou
não passo duma nota de três real

Sou malandro nadinha de perfeito
lhe compro flor na banca duma praça
se meu atraso for mais que um horror

Lhe falo sou sincero desse jeito
não me xingue, nem ligue pra essas graças
Moça bonita me faz seu amor

Coroa de Sonetos de Amor - XV

Moça bonita me faz seu amor
sabendo onde estão sem sequer lhes ver
nesses sonhos que são da nossa cor
o que nunca jamais vamos perder

Eternidades são de um só calor
de sua face na minha padecer
quero seu beijo com fogo e fulgor
tão forte que me faz quase morrer

Linda não fale só faça a promessa
não, não diga mais nada só o seu sim
é minha por inteiro tal lhe sou

Não quero que se assuste nem esqueça
quero que saiba bem que como a mim
Moça bonita, nunca alguém lhe amou

domingo, 21 de abril de 2013

Não sou bom partido,
sou melhor inteiro.

terça-feira, 16 de abril de 2013

de pulso


Inventamos o relógio
numa genialidade louca
para nos esquecer

de nossa estupidez
de nossa insensatez
de nossa pequenez

Olhamos pro relógio
pra não cairmos
no doce conforto

de criarmos deuses
de criarmos mitos
de criarmos sonhos

Pois ao olhar pro céu
em busca do tempo
nós nos damos conta

de quanto é infinito
de quanto é eterno
de quanto é absurdo

na parede como altar
o relógio dita a casa
como no pulso o homem

os precisos relógios
são nossas correntes
modernas e perfeitas

Que nos fizeram enfim
libertos dos deuses
mas escravos da máquina

domingo, 14 de abril de 2013

Os críticos literários de ocasião


Recolhendo os livretos depois de muitos risos, sorrisos, pagamentos graúdos pelos livretos e muitos agradecimentos até que...
-Gostou dos Poemas?
-Gostei de alguns mas você repetiu a palavra poeta duas vezes em um poema e isso é errado. - disse ela devolvendo pra mim o livreto.
-Errado? Sou poeta, eu posso. Conferiu a escansão dos poemas também? - respondi irônico.
-Você é quem sabe, estou lhe ajudando. - disse ela arrogantemente
Fiquei indignado e respondi:
-Já vendi mil e quatrocentos livros em um ano aqui no metrô. Obrigado por sua ajuda. 
Sai do vagão e continuei minha meta de vender pelo menos cem livretos num dia de chuva e levar poesia para pelo menos dez vezes mais pessoas.

sexta-feira, 12 de abril de 2013

Queijos


I - Entrada

Queijo combina com vinho
tal o beijo com carinho
mas se combinar demais
vira suspiros e ais

II - Convite

Quero um jantar bem gostoso
pão molhado no foundue
coberto de queijo cremoso
com velas ali e aqui


III -Dizem

que quanto mais fedorento
mais refinado é o queijo
mas é teu perfume suave
que saliva meu desejo

sábado, 6 de abril de 2013

Pechincha de feira


Se pela boca desdenha
mas o corpo quer comprar...
Como apagar essa lenha
com tanto fogo a queimar?

Só há um jeito meu bem: venha
cá comigo se deitar
sem perigo sabe a senha:
fruta doce do pomar

por estas maçãs tenha
fé que vai se aconchegar
entre bananas da Penha
e caquis d'outro lugar

na cesta quero que tenha
tudo que pode levar
da feira de Saramenha
mas seu pudor vai ficar

cuidarei dele pequena
com saudade de matar
queroso: de novo venha
cá comigo se deitar...

sexta-feira, 5 de abril de 2013

Homicídio Coletivo


Sobre o ônibus que despencou do viaduto. Me parece uma crônica de uma morte anunciada. Quantas vezes eu não xinguei o ônibus que simplesmente não parou no ponto? Quanta vezes eu não tive que andar e até atravessar o viaduto porque o ônibus não parou no ponto? Quantas vezes eu não fiquei mofando no ponto porque o motorista resolveu cortar caminho e não passou pelo meu bairro? Quantas vezes o trocador olhou pra minha cara e disse que não tinha o cartão da integração e que eu devia comprar as duas passagens pelo preço integral?  

Contei muitas vezes até dez, muitas vezes até mil e me resignei e não fiz nenhuma besteira. Mas mentalmente já me sentei na frente do ônibus que não quis abrir a porta pra mim quando estava parado no sinal e no ponto. Mentalmente já joguei pedra no ônibus que não parou no ponto de madrugada. Mentalmente já agredi o motorista. 

Mesmo sabendo que o cara é pressionado por uma empresa escrota que lucra rios de dinheiro fazendo com que ele faça sempre uma viagem mais rápida que a anterior. Mesmo sabendo que a passagem aumenta pra mim mas no salário dele nem faz diferença, continua recebendo a mesma miséria.  Mesmo sabendo que faz jornadas longas e estressantes e agora dupla trabalhando como cobrador e motorista. Mesmo sabendo de tudo isso por pouco controlei minha raiva e minha frustração. 

Mas esse controle, esse eterno engolir sapo uma hora estoura. Uma hora alguém não suporta mais, mais um dia em que vai ter que atravessar o viaduto porque a porra o motorista não parou no ponto. Mais um dia que vai ter o ponto cortado porque a porra do passageiro demorou demais pra descer. Motorista e passageiro no mesmo moedor de carne do lucro da empresa,consórcio rodoviário que "ganhou" uma concessão pública para explorar o transporte em massa da cidade. 

Fácil buscar culpado no motorista que estava acima do limite de velocidade. Fácil culpar o ex-futuro-engenheiro que pulou a roleta para agredir o motorista. Quando são dois agente-vítimas de um crime arquitetado há anos, meses, dias após dias de maximização dos lucros de centavo após centavo lucrado indevidamente às custas de tantos trabalhadores, de tantos passageiros que são levados de um lado pro outro como gado. 

Não tenho respostas fáceis, mas os culpados não tem o rosto colocados nos jornais.  Não estão agora deitados em macas nos hospitais. Estão confortáveis em seus lares vendo todos dizendo que a culpa é do estado que não fiscaliza. Estão lá prefeito, governador, empresário e empreiteiro felizes e contentes com sua máquina de fazer dinheiro azeitada com os corpos de trabalhadores-indigentes.

quinta-feira, 14 de março de 2013

aos primeiro de Março


só me faltam
três pros trinta
e me assaltam
dúvidas infinitas

seria essa uma crise
de meia-idade precoce?
Ou mais uma rebordose
de um velho adolescente?

vinte sete anos
com teto mas sem tento,
carreiras, filhos,
carros ou casamento

vinte sete anos
Três faculdades,
um livro publicado
e outro pela metade

meio mambembe vendo
meus versos de vagão
em vagão com que pago
a cerveja e o feijão

meio lixeiro recolho
pedaços de meu coração
remendo, costuro e colo
uma mentira sem tesão

três pros trinta
é pouco sucesso
mas muita tinta

três pros trinta
é muito verso
pra poema de quinta


domingo, 10 de março de 2013

Poeta

Poeta de bolsa bermuda e camiseta
um poeta tropical de férias do mundo
no trem lhe faz feliz o riso e a careta
do leitor que se espanta no seu verso imundo

Verso alexandrino poesia barata
mesmo no calor do rio seu metro é fecundo
E o livreto de preço livre a fome mata
Podendo esse poeta viver vagabundo

Ele faz com os coelhos que nas suas tocas
dormem saindo só se a lua no Rio de Janeiro
surge no céu e nos trilhos o ritmo toca

As sandálias gastas do poeta mineiro
contam de seu calor nas terras cariocas
"usar sapatos não dá nesse braseiro!"

quinta-feira, 7 de março de 2013

SD


Tenta tenta escrever filho da puta
que cê tá doido doido demais
roda roda mas não chama o seu juca
cê sabe, isso é o que o brigadeiro faz

Doido, maluco beleza e batuta
só pelo poder de Jah me veio a paz
Tudo doce sem gosto de cicuta
e a moça do chapéu beija o rapaz

toca, toca mas não chama o raul
to louco, to na trava, bateu o sino
esse veio de Saquarema do Sul

todo excesso nos leva pro divino
Dionisio é melhor que Belzebú
sou ele na sua sede de vinho

quarta-feira, 6 de fevereiro de 2013

Um trabalho bem bolado


A minha vida é irreal, surreal. Muitas vezes se escuta "minha vida daria um livro" mas não é meu caso. Minha vida não daria um livro pois não possui qualquer ponta de verossimilhança. Sim, eu moro na cidade do Rio de Janeiro e vivo as custas de meus versos. Sim, eu vivo de poesia! E antes que os românticos relembrem o casal que vive de amor lhes digo. É meu trabalho, levo poesia de mão em mão nos vagões dessa cidade louca.

Pensando como meu pai, mãe e irmão administradores eu procurei um nicho de mercado, um espaço carente de cultura e principalmente de poesia. Poetas urbanos o Rio está cheio, transbordando. Mas só nos lugares de sempre. É impossível passar na frente do CCBB, Teatro Municipal, Biblioteca Nacional sem encontrar com essas incríveis figuras... 

Eu acho que seria mais um se não fosse por esse tino que veio de família. Meu pai sempre me contou a história de dois funcionários de uma empresa de calçados que foram mandados para a India, o primeiro voltou dizendo que não recomendava de jeito nenhum instalar lá uma fábrica pois ninguém lá usava sapatos, já o segundo voltou dizendo que deviam se preparar imediatamente pois lá ninguém AINDA usava sapatos. 

Na frente dos centros de cultura todos já estão de certa maneira saturados de poesia, vêem e lêem todo dia arte, literatura, poesia.  E são sempre os mesmos frequentadores, um público bem restrito. Dentro dos vagões eu encontro gente de toda sorte que teve o azar de não ter tempo, oportunidade, interesse de degustar um pouco de arte naquele dia. Meus livretos são algo raro dentro dos vagões. São calçados novos num lugar onde tantos nunca experimentaram uma par de sandálias.

O prazer que levo para esses leitores em potencial gera todos os tipos de reações e hoje foi mais um daqueles dias chuvosos que parecem que se não rendem muita grana pelo menos dão ótimas estórias. Sai de casa hoje depois de um bocado de esforço para vencer a preguiça, mas finalmente consegui! A primeira viagem Tijuca-Gal. Osório não foi lá essas coisas, todo mundo desinteressado, com frio e dormindo. Algumas poucas almas tinham um lampejo e me deram cinco reais cada uma em alguns vagões. Um jovem negro que parecia que tinha saido de um dia longo levou meu livro "Sobre Máscaras e Espelhos" com um sorriso branco no rosto. Mas era uma daquelas viagens desestimulantes sem muitas reações positivas. 

Cheguei em Ipanema torcendo para que a volta fosse um pouco melhor, mas não foi. A mesma desanimação e sonolência na maioria dos vagões. O desânimo já ia me abater quando resolvi trocar de linha em Botafogo e seguir o itinerário em direção a Pavuna. Sabe como é, já estava ruim ali, não custava arriscar a sorte em outra linha. Em partes deu certo, havia muita gente animada, feliz e rindo nos vagões. E dai choveu moeda, vagão por vagão os livretos foram vendidos e recebidos com sorrisos lindos. Isso me empolgou que nem vi que passei pela Estação Central. "A estação Central é a última estação para a transferência entre as linhas um e dois" Dessa vez eu não escutei essa frase da moça do aviso sonoro.  

Mancada minha, já era tarde demais e a volta os vagões estariam desertos, como já estava tudo fodido mesmo continuei ali seguindo em direção a Pavuna pois pelo menos a ida tinha gente em cada vagão. Mas como eles não são infinitos acabei o último vagão da composição e saltei em Maria da Graça. Agora era encarar a volta. Enquanto esperava o trem que me levaria até a Central e da central até minha estação de desembarque eu fui dar uma conferida nos rendimentos do dia.

Foi hilário constatar que tinha recebido praticamente a mesma grana indo pra zona sul e indo pra zona norte. Na zona sul menos gente contribuiu com muito e na zona norte muita gente ajudou cada um com um pouquinho. Pode parecer estranho mas fico mais feliz com várias pequenas contribuições do que com uma grandona. Sinto que faço mais diferença, que estou sendo melhor acolhido por tantos ao invés de só por três ou quatro passageiros da zona sul.

Contado o dinheiro o jeito era encarar a volta e sem surpresa entrei nos vagões desertos. Pouca gente no primeiro um livreto vendido para um casal simpático, No segundo um par de idosas comprou os livretos também, no vagão seguinte fiquei de papo com uma linda loira de cabelos longos e unhas compridas e marmorizadas, ela queria levar o livro, mas não tinha mesmo dinheiro e acabou levando só o livreto.

Troquei novamente de vagão na estação São Cristóvão e era um vagão com apenas seis pessoas, um casal se beijando ao fundo, um jovem no seu Ipad, um senhor de idade de camisa vermelha e uma mulher de seus quarenta anos em uma forte crise de gripe. O casal não parou de se beijar, o jovem do Ipad pegou o livreto mas voltou a mexer no Ipad, o senhor recusou e a mulher pegou o livreto com um sorriso cansado no rosto. 

Caminhei pelo vagão esperando o tempo passar, vi que o jovem realmente não ia largar o Ipad por nada e a mulher quando me viu chegando perto perguntou se eu estava vendendo eu fiz que sim com a cabeça e sorri. Ela tinha guardado o livreto em sua bolsa e então o retirou e começou a lê-lo. Nisso chegamos a estação Cidade Nova onde entrou um par de meninas novas mas que recusaram o livreto em meio a um papo muito animado. Estávamos quase chegando na Central e peguei o livreto do jovem do Ipad, ele me entregou sem desgrudas os olhos da tela. 

Caminhei em direção a mulher que estava agora com uma cara bem melhor e disse: "Poesia faz bem né? Quanto custa?" eu como sempre disse que o preço era livre, que poderia contribuir como quisesse e ela começou a remexer na bolsa até que resmungando para si mesma "Só tenho cinco centavos" mas dai olhou pra mim com uma cara de iluminação e perguntou: "Você fuma um baseado?